quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Jostein Gaarder - O Castelo Nos Pirineus

Primeiro devo agradecer ao meu grande amigo Dênis de Brito por me emprestar esse livro. Agora mãos a obra. Prosseguindo o Desafio Literário e avançando em faixa etária. Se Memórias do Quintal foi escrito para crianças entre seus 7 a 13 anos, O Castelo nos Pirineus foi escrito para jovens entre os 13-18 anos que possuem sérios problemas para viver em sociedade, afinal, se você tem essa idade e passa o seu dia inteiro lendo um livro que discute ciência e religião das 3 uma: ou você não tem amigos, ou não tem nada melhor para fazer, ou é NERD. Eu pelo menos leria pelos 3 motivos.

Brincadeiras a parte, a primeira alfinetada ao livro vai quanto à tradução. PELO AMOR DE DEUS COMPANHIA DAS LETRAS, não estamos mais em 1800 onde não havia tradutores de várias línguas e eramos obrigados a traduzir de outras versões, mas em pleno ano de 2010 traduzir por meio de uma tradução em Alemão? Qual o motivo disso? Por um acaso procurou-se economizar? (para quem não sabe, um tradutor de Norueguês cobra mais caro que um de Alemão) Depois dessa, a Companhia perdeu uns dois pontos comigo.

O outro ponto que devemos nos acostumar no livro é em relação aos nomes noruegueses, que são complicadíssimos. Nossa leitura se baseia em uma memória sonora (sempre que lemos, relacionamos o texto escrito com o som), e é muito difícil lembrar dos acontecimentos e lugares se não se sabe a pronúncia. Qual o problema com os nomes? Veja uns exemplos e julgue: Nesøy, Flåm, Hjønnevåg, Rysjedalsvika, Tyrifjord, Drammensvassdraget, Hønefoss, Hemsendalsfjell e etc... Só o que sei é que "j" tem som de "i" como semivogal. Claro, com o tempo você se acostuma.

Não posso ficar aqui só falando dos problemas! Devo falar de algumas coisas bem legais do livro, como por exemplo as paisagens são bem descritas e são muito interessantes (embora possuam nomes horríveis). A ambientação da narrativa se passa na maior parte do tempo na Noruega, mas em alguns momentos o livro nos remete a áreas de outros países (como Estocolmo na Suécia). Há muitas ilhas, montanhas e fiordes no livro, que me faz ter uma sensação agradável, pelo espaço ser múito tópico.

A narrativa é simples e muito repetitiva. A forma de narração é mais interessante que a própria história. O livro é contado na forma dos e-mais trocados entre os personagens principais: Steinn e Solrun. Ambos possuem ideias antagônicas ao tratar dos assuntos e acontecimentos, enquanto ficam trocando correspondência. Por conta disso, há pouco rigor estilístico na construção do romance (afinal, os e-mais usam a linguagem casual), além de tornar o texto cansativo em alguns momentos, devido as digressões e repetições infindáveis. Os acontecimentos são contados em ordem caótica, e é uma pena que esse escritor não soube usar esse estilo de forma agradável.

Como é tradicional de Jostein Gaarder, o livro segue o mesmo padrão dos anteriores, de estabelecer discussões filosóficas, teológicas e ciêntíficas, de forma que agrade e chame a atenção dos leitores jovens. Porém, nunca o autor foi tão infeliz em seu objetivo quanto em "O Castelo nos Pirineus". Em "O Mundo de Sofia", "O Dia do Curinga" e "Maya" por exemplo, o escritor consegue chamar bastante atenção do leitor para os assuntos extranarrativos que surgem, enquanto nesse livro essas discussões cansam e atrapalham a narrativa, além de não possuir (como nos outros livros) a variedade de assuntos e motivos.

Outra infelicidade de Jostein Gaarder foi em relação aos personagens. Não há mais o cômico curinga ou o jovem Hans Thomas de "O Dia do Curinga", ao mesmo  tempo que não há o misterioso filósofo que manda cartas para Sofia; ao contrário, os personagens de "O Castelo nos Pirineus" são extremamente esteriotipados e vazios. Steinn e Solrun são duas frutas ocas, que não têm poupa, e nem mesmo suas cascas têm sabor. Os dois piores personagens já criados por Gaarder são protagonistas desse livro.
Alerta!!! Esse texto pode conter spoilers como o fato de que Solrun morre ao final ou que toda a discussão e reencontro dos personagens pode não ter servido para nada. Agora que você já sabe disso, pode continuar lendo o texto sem preocupações.
Chegando no plano da narrativa, há pelo menos um ponto de grande interesse. O desfecho. Nas últimas páginas do livro, conta-se definitivamente o acontecimento "surpreendente" relacionado com a "Mulher Amora". Embora o acontecimento é extremamente previsível e a narrativa não gera interesse nenhum para esse final (gera talvez curiosidade, mas interesse de fato...). Mais importante que o acontecimento em si, são as duas reflexões finais sobre todo o acontecimento. Essas reflexões são a base do livro, e se você começar a ler o livro por elas não vai perder nada, o que me faz pensar que esse livro seria melhor como conto ou novela curta, pois só possui temanho de romance devido ao excesso de coisas inúteis no livro. A partir daí acontece uma pequena mudança nos personagens e nos fatos, e quando você pensa que vai melhorar, o livro acaba com a morte de Solrun, que pode deixar 8 de cada 10 leitores revoltados. Isso é excelente, pois, se há revolta, é a prova de como o loivro é bom, afinal, muito melhor que a letargia que 75% do livro causa nos leitores. Por fim, as ultimas palavras de Solrun colocam em cheque a utilidade de toda essa discussão do livro.

Por fim, gostaria de afirmar que esse livro não é o que eu pensava que seria, pois superestimei a habilidade do escritor. Recomendo a leitura descompromissada, mas há uma série de livros mais interessantes que esse. Aparentemente, o livro foi traduzido e/ou escrito às pressas, pois a primeira edição (2010) contém uma série de erros de pontuação e alguns erros de concordância (se não me engano, encontrei também 2 erros de ortografia), mas provavelmente essas deficiências vão ser sanadas em edições posteriores. O maior vilão desse livro entretanto é ele mesmo.

Só por questão de curiosidade, o nome do livro é baseado em uma pintura de um artista da Bélgica. O quadro chama-se Le Chateau des Pyrénées e é esse que segue abaixo:
E quanto a minha avaliação de hoje, talvez tenha pegado um pouco pesado, mas meu humor não está muito bom hoje, afinal, não é todos os dias que um ônibus me arrasta meio quarteirão no asfalto. Como esse post faz parte do Desafio Literário, para conferir a minha lista do desafio clique aqui. Para conferir a lista de Janeiro Clique aqui.

Como meu exemplar de "O Guia dos Mochileiros da Galáxia" foi extraviado e não achei em nenhuma outra livraria, minha lista vai mudar um pouquinho, e Fitzgerald (livro Bônus) vai assumir essa posição (afinal, para isso servem os bônus), enquanto o "Guia" Vai para ficção científica.

Nota do Elaphar: 7,8

Edição Lida:
GAARDER, Jostein. O Castelo nos Pirineus. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.

6 comentários:

  1. Gostei da resenha... estava com esse livro na lista de prioridades pro conta de "O dia do Curinga" mas agora ele vai ficar em hibernação por um tempo...

    Uma pena que não tenha recebido O Mochileiro, que é ótimo... mas vais ler Fitzgerald!!! Não sabia que O Grande Gastby era infanto-juvenil. Fiquei curiosa agora...

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  2. Puxa, eu estava com vontade de ler esse livro, agora não sei se me arrisco a comprá-lo...

    E até onde eu sei, O Grande Gatsby não é infanto-juvenil. Pelo menos eu não o classificaria assim.

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  3. - Lulu e Lígia
    Não queria espantar vocês, mas sou sincero e acho que "O Castelo..." não é um livro que deva ser priorizado. De qualquer forma, não custa nada fazer como eu (pegar emprestado) e ler.

    Quanto ao "Grande Gatsby", eu sabia que ia haver uma discordância, mas não esperava que seria tão rápido. Vou explicar melhor a questão no post, mas vou tentar me defender en passant.

    Por infanto-juvenil entendemos uma literatura destinada às crianças (infantil) e/ou aos jovens (juvenil), porém, essa caracterização é basicamente histórica, e uma literatura pode tornar-se infanto-juvenil (como é o caso de Hoffmann e os Brüder Grimm), ou deixar de ser. Adotando-se uma perspectiva sincrônica, Lígia está correta: "Gatsby" não é infanto-juvenil, e não devia ser considerado como tal. Adotando-se uma perspectiva diacrônica, "Gatsby" foi um livro destinado ao público jovem (16-20 anos, e portanto juvenil), e apenas hoje (mais de 60 anos depois) é considerado um clássico popular (assim como Doyle e Jorge Amado). Quero ao resenhar "O Grande Gatsby" mostrar uma análise diacrônica do próprio conceito de Juvenil, assim como buscar todas as faixas etárias desse gênero de literatura nas minhas 3 resenhas.

    Se isso pode ser considerado um lapso, é com certeza muito menor (e mais justificável) do que considerar "Romeu e Julieta" como Obra Épica (como faz a lista de sugestões do DL). De qualquer forma, peço que leiam a minha resenha, depois vejam se concordam ou não com minhas assertivas.

    Obrigado pela visita.

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  4. Elaphar, você está bem? Menino, também não tenho uma relação muito boa com ônibus, não. Voltando à sua leitura, é de se lastimar que um livro chegue às mãos do leitor sem revisão e com traduçãos mal apanhadas. Entre lapsos maiores e menores e preciosismos à parte, reconhecemos que nossas indicações não são a última palavra em conhecimento literário. Não somos literatas. Quanto à obra listada em nossas dicas, pensamos que valeria a intencionalidade épica da obra, uma vez que mesmo sendo uma tragédia clássica o enredo contém elementos da narração épica. Além disso não se pode desconsiderar o fato da obra derivar-se das epopéias do herói trágico, como por exemplo: Tristão e Isolda. Enfim, a proposta do DL não visa adotar purismos. Não somos bons nisso. Definitivamente. Lamentamos os lapsos, as falhas ocorridas e as que ocorrerão. E o bacana é isso: aprender com quem sabe do riscado. Obrigada!
    Bjs

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  5. Estou bem sim! Por sorte não me feri no asfalto, mas os livros que carregava (A Ratazana de Günter Grass, O Terceiro Homem de Greene e O Livro dos Volsungas, a saber) ficaram com as lombadas machucadas pelo asfalto!
    Também concordo que as editoras deviam caprichar na revisão, principalmente se tratando de livros de alto poder de venda.
    Agora, me perdoem se pareci meio agressivo (as vezes não sei me expressar direito), mas minha intenção não era criticá-los, e nem pretendo que a minha leitura seja a ultima palavra (independente de minha formação na área de literatura). Muito menos sou fã de purismos (dá para perceber pela minha escolha 'inusitada' de O Grande Gatsby, e outros livros que não seguem a risca o que me diz a teoria literária). De fato, em Romeu e Julieta há influencias de personagens clássicos (como Príamo e Tisbe), mas não consigo fazer uma associação mental com a épica, principalmente quanto à formação de uma identidade, característica primordial na épica. Mas os gêneros e estéticas literárias não são estáticas, e podem haver muitas interpretações sobre obras específicas, e minha interpretação não é melhor que a de vocês e vice-versa. A questão é argumentar em defesa de sua tese, e, embora ainda não faça a associação mental Épica-Romeu e Julieta, pode haver argumentos que norteiam essa escolha, assim como tenho motivos para botar "O Grande Gatsby" como Infanto-Juvenil.
    Gostaria de pedir que leia a próxima resenha e gostaria também de agradecer a visita e pedir desculpas por qualquer coisa.

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  6. Que maravilha de post!é a primeira vez que leio um post seu e adorei!principalmente qdo você se refere a Cia da Letras, kkkk. Eu acho que isso é falta de compromisso com o leitor. Aliás, que leitor? O Brasil é pobre em leitores e o sistema editorial brasileiro é uma vergonha.
    Valeu o post.

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