sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Memórias do Quintal - Alfredo Garcia

Demorei mas comecei postei meu primeiro livro do desafio literário. O motivo por eu postar o reserva antes do titular é por conta de que esse livro é ums excelente amostra de literatura infanto-juvenil nacional.

Para quem não conhece (creio que uma grande maioria dos que leem esse post), Alfredo Garcia é umescritor paraense nascido na cidade de Bragança (meu conterrâneo), que escreve poesia desde jovem mas se destacou de forma muito especial no conto, gênero esse que lhe rendeu muitos prêmios e publicações. Possui vários livros publicados como O Homem pelo Avesso, Meninos & Meninos, Pé-de-vento (esgotados), O Livro deEros (Adulto), Epifanias (o mais recente) e, é claro, esse livro que resenho agora. É um dos poucos escritores que possuem um talento singular ao escrever para crianças e adultos.

O primeiro ponto interessante (na verdadeo último, mas não importa) é a entrevista de Alfredo ao fim do livro (presente apenas na 2ª edição revista), e uma das partes mais interessantes é essa:
É mais fácil escrever para crianças?
- Costumo dizer que não há uma literatura infantil e uma literatura para adultos. Há literatura ou Literatura, dependendo,claro, da qualidade. Nós temos essa rotulagem que a sociedade capitalista e a própria industria cultural impingem-nos. Eu acho o leitor menor mais difícil, porque é um leitor exigente (...) que concebe a literatura como algo mágico, lúdico, ao contrário do leitor adulto, que deseja que o autor escreva atendendo aos anseios do seu dia-a-dia, que fale de seu cotidiano. (...) O lúdico atrai o leitor, não fórmulas gastas (...).
Indo para os contos propriamente ditos, percebemos um tom nostálgico e memorialista, que, não sei se agrada as crianças, mas dá a nós (seres saudosistas) a impressão de regredir violentamente no tempo, para um tempo despreocupado mesmo em suas micro-tragédias e micro-epopeias. Tudo isso é encontrado sobretudo no primeiro conto ("Era um Menino que Apontava Estrelas").

"Era um Menino que Apontava Estrelas" é, dentre todos os contos do livro, o mais memorialista e nostálgico. Acredito que ele deu o título ao livro (pois o menino apontava para as estrelas de seu quintal, e relembra pela memória). A história é de uma criança que viveu o período da ditadura militar e do avanço dos ideais do comunismo e do conflito religioso (maçonariaXcatolicismo), e que seu pai pertencia a ambos os grupos geradores dessa tensão e a criança procura entender as ideologias do pai, o que só mais tarde consegue de forma satisfatória. Mesmo esse fundo profundo, o conto é bem "simpático"de ler e, não obstante a linguagem ser bem trabalhada, não chega nem perto de ser hermético.

O segundo conto ("O Dia da Morte de Agileu, o Conspícuo") nãochega a ser tão profundo quanto ao primeiro, mas possui uma agitação maior, o que favorece bastante o prazer da leitura. Ao invés da nostalgia e o drama reflexivo anterior, entra em cena o pesado drama de impacto e a comicidade das coisas infantis (não nessa ordem). A curiosidade (principalmente presente na fase infantil) está posta de forma interessante na obra, além dos vários tipos de comportamento presentes no universo infantil, tanto antigo como mais moderno (ou pelo menos das cidades ribeirinhas, e se você não é de uma, teve a infância mais chata do planeta).

Em seguida vem o conto "O Dia do Herói" é um conto muito interessante sobre o heroísmo, tema que, de forma beeem diferente é sutilmente tratado no conto seguinte: "Perna deMoça". "Perna de Moça" é uma história cômica das brigas presentes nessa faixa etária, e dentre os contos do livro é o que mais diverte e o que mais se aproxima do universo infantil moderno brasileiro urbano e semi-urbano. Alfredo mostra toda a sua técnica narrativa ao tratar um tema que requer cuidados redobrados com a linguagem.

"O Dia do Herói" e "Perna de Moça" são os contos mais lúdicos do livro, em contrapartida, os dois contos que seguem ("Primícias" e "Passarinhar"), na minha análise, não deveriam fazer parte desse livro, mas sim de outro. Os contos não são ruins, não é isso, mas não considero adequados estarem em um livro (em tese) "para crianças". Diferente do que acontece em "Perna de Moça", em "Primícias" a uma aparente despreocupação com a linguagem, ao ponto que todo o conto está coberto de "motivos" sexuais que podem até escapar em uma primeira leitura, mas ao ler com cuidado percebemos claramente. Quanto a "Passarinhar", o conto é excelente, mas acredito que sua letargia agrada muito a um crítico literário, mas irrita profundamente uma criança, porém, posso estar errado, pois não penso como criança a muitos anos.

Por fim, o ultimo conto (Pirulim) é um caso a parte no livro, e acho que é agrada qualquer pessoa (criança, jovem ou adulto) que gosta do gênero conto. Como bônus, deixo o trecho final desse conto:
O pai chama o menino com a autoridade dos adultos e o menino, mesmo não querendo ainda ir, acompanha o pai. Antes de sair lança um último olhar aohomem que bebe o chope bem devagar e mastiga o pedaço de queijo, também sem pressa (...). E o que ele nunca mais vai esquecer na vida é aquele olhar de desespero e de abandono do homem sentado na mesa, bebendo o chope, comendo o queijo. O homem que ele conheceu como o palhaço Pirulim e que ele vê agora apenas como uma pessoa, uma pessoa sem graça.
Se definirmos a literatura infanto-juvenil como uma literatura que prepara e forma o leitor, e podemos afirmar que Alice de Carroll e os contos dos Bruder Grimm preparam o leitor para uma literatura mais ágil, podemos dizer também que Alfredo Garcia e seu Memórias do Quintal preparam o leitor para apreciar uma obra mais lenta e/ou memorialística; aprender a ter prazer nesse tipo de leitura.

Como eu estou de bom humor hoje, nãovou falar das questões materiais do livro. Não que a capa, as folhas e a diagramação possuem problemas, mas as orelhas e 4ª capa........... Esse livro pode ser comprado direto na editora Paka-Tatu ou pela Estante Virtual. Para conferir a minha lista do desafio clique aqui.

Nota do Elaphar: 8,4

Edição Lida:
GARCIA, Alfredo. Memórias do Quintal. 2ª Ed. Revisada e Ampliada. Belém: Paka-Tatu, 2001, 84p.

Seguindo a progressão etária (criança, pré-adolescência e adolescência), o próximo livro vai ser o titular, mas primeiro... um post especial sobre o Pequeno Príncipe.

11 comentários:

  1. ele tá no meu desafio mas nos regionais.
    já pus uma resenha sua no blog. está com seu nome e uma tag só sua.
    gostei muito da resenha, mas acho q tirarei do meu desafio...

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  2. Pois é, a função da literatura é tão ampla que não há como restringi-la a um determinado público ou limitar sua mensagem a um só significado. Sua resenha elucidou muito bem esses pontos. E o livro parece-me uma boa pedida! Bela participação.

    Abraços

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  3. Muito interessante a sua escolha. Traz uma abordagem diferente sobre o tema do mês. Precisamos divulgar sim novos autores e novas obras.
    Gostei bastante do teor da sua resenha.

    Parabéns!

    Abs, Rê

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  4. - Tiabetok
    É uma pena, pois é um livro bem interessante. De qualquer forma recomendo a leitura.

    - Vivi
    É sim. Aproveite para encomendar o seu exemplar pela editora. O link está na resenha XD.

    - Rê
    Obrigado. Também acho que é importante conhecermos escritores novos, afinal, não podemos ficar sempre nas mesmas leituras.

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  5. Interessante a escolha... ainda não li, mas tenho vontade!

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  6. Realmente não conhecia o autor, mas a sua resenha me fez ficar interessada e vou procurar o livro para ler, obrigada por compartilhar.
    Beijocas

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  7. Sou professora da Escola Estadual Mário Queiroz do Rosário, cidade de Bragança, onde nasceu Alfredo Garcia. Estamos organizando uma Gincana Literária visando estimular o hábito da leitura em nossos alunos do ensino fundamental e médio, e uma das obras escolhidas como leitura obrigatória é o livro de contos Memórias do Quintal que está sendo bem aceito por nossos leitores, até por se tratar da obra de um conterrâneo .

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  8. Este comentário foi removido pelo autor.

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  9. Olá Roselis,sou do curso de letras, e achei interessante o trabalho de vcs na escola em Bragança, gostaria de falar com vc, sobre a importância da obra, já que estou desenvolvendo uma pesquisa sobre a mesma " Memórias do quintal". Deixo meu email para contato: jhennyfersilva07@hotmail.com.

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