Henry James é considerado por muitos um dos maiores escritores norte-americanos, merecendo apreço de outros grandes escritores como Josef Conrad, e considera-se que suas obras estão carregadas de fundo psicológico. A Volta do Parafuso (ou Os Inocentes) é um de seus livros mais famosos, contando até com uma famosa adaptação cinematográfica.
O livro inicia-se com uma narração de história sombria numa velha casa no Natal, onde um dos amigos de Douglas (um dos narradores do livro) contou uma história onde uma aparição surgia para uma criança. Os que ouviram a história ficaram estarrecidos, mas Douglas lembrou de outra história "horrível demais". O nome do livro provém de uma expressão usual (Another turn of screw) que significa aumentar a tensão, sofrimento, dor e etc... Se uma história horrível é mais horrível ainda com a presença de uma criança, o que diria de duas? Esse é um ponto chave da narrativa: duas crianças, dois adultos, duas aparições e duas voltas.
Antes de falar um pouco mais do duplo, a narrativa possui 3 narradores, um que narra a noite de Natal e comportamento do amogo Douglas, depois o próprio Douglas narra o como ele conseguiu o manuscrito e dá um prólogo da narrativa, depois Douglas lê a narrativa de um manuscrito escrito pela protagonista da história, e terceira narradora. Além de não termos uma narração direta, a narrativa é complexa, profunda e que não se reduz à um único caminho, o que torna dificil (e praticamente impossível) "fechar" uma análise profunda da obra sem cometer o pecado da omissão, e, por outro lado, uma análise superficial demais é (além de impraticavel) um assassinato ao livro, que já ataca os leitores vulgares e superficiais no primeiro capítulo. Também vou tentar evitar spoilers o máximo possível, mas de qualquer modo, o desfecho da história não é mais importante (e interessante) que seu desenrolar.
A narração é magnificamente complexa e ao mesmo tempo saborosa de se ler. Apesar de, a princípio, achar-mos as crianças "plastificadas", percebemos a importância disso para o próprio desenrolar da obra. O clima sombrio que James constrói, além dos "labirintos" da narrativa nos guiam por diversos caminhos de leitura. Se você acha uma discussão inacabada o tradicional "Capitu traiu ou não traiu Bentinho?", o que dirá de uma narrativa onde tudo é dúvida? A visão é uma dúvida, as aparições, as crianças, a loucura, enfim... tudo.
Apesar de ser apenas um livro, em A Volta do Parafuso dois outros textos se fazem presente (e eu se fosse vocês procuraria lê-los o mais rápido possível): O Homem de Areia (Der Sandmann) de E.T.A.Hoffmann e o poema O Erlkönig (Der Erlkönig, também conhecido como Rei dos Elfos) de J.W. von Goethe. O Homem de Areia é um livro bem fácil de encontrar por ser um "clássico" do Romantismo Alemão, embora deve-se ter cuidado com as adaptações infanto-juvenis do livro, já que elas tiram todo o clima absurdo, sombrio e violento do livro. Para quem lê inglês ou francês, o Erlkönig é um dos poemas alemãos mais traduzidos. Para os monolíngues as únicas opções legíveis do Erlkönig são as traduções portuguesas (que podem incomodar os brasileiros devido aos "a ver", "rebento" e etc...) e a tradução anotada que fiz recentemente (e pode ser conferida clicando aqui), as outras traduções que podem ser achadas na internet não são minimamente legíveis.
Há relações óbvias com o enredo de O Erlkönig (a aparição à uma criança, o adulto tentando proteger, a morte e etc...), o que me leva a crer que a referência inicial à uma história horrorosa é uma referência ao Erlkönig. Para além das referências óbvias, ambos os textos são polissêmicos ao extremo: o que é realidade? o que é loucura? quem vê demais? quem não vê? seria doença?. A visão é outro ponto chave da narrativa, e me remete diretamente ao Homem de Areia, onde a narrativa se baseia na dúvida, no ver e não ver (no Homem de Areia o órgão da visão também é fundamental: o Homem de Areia joga areia nos olhos, a boneca robô têm seus olhos arrancados e etc..) e isso é chave importante nas três narrativas (isso considerando o poema de Goethe como narrativa).
Além da visão e dúvida (e por consequência a loucura), outro tema chave da narrativa é o duplo. Uma análise mais superficial nos dá uma rápida visão de que A Volta do Parafuso é um Erlkönig duplicado, mas não é somente isso, pois além de dois adultos, duas aparições e duas crianças, os fantasmas aparecem duas vezes em cada lugar (na torre, no lago, na escada e etc...), a preceptora vê seu patrão apenas duas vezes, o Peter Quint (uma das aparições) pode ser compreendido como uma duplicação da imagem do patrão, assim como a segunda aparição uma duplicação da imagem da preceptora (além do fato de haver duas preceptoras), e poderia ficar citando imagens duplicadas durante horas a fio. Essa duplicação também aparece de forma marcante no Homem de Areia na imagem (ou na possíbilidade) do ser duplo (der Doppelgänger). Seria Coppola um Doppelgänger de Coppelius? Da mesma forma que as aparições seriam duplicatas dos adultos?
As comparações que faço não são arbitrárias. A concepção dos três livros se assemelha, assim como seus temas e simbolos. Além disso, Goethe é uma influência incontestável (diretamente ou não, intencionalmente ou não) em praticamente tudo o que se fez depois dele, e Hoffmann é a base fundamental da narrativa sombria (em alemão Schauerliteratur), e influenciou diretamente um sem número de obras, particularmente em obras de língua inglesa. Apesar das obras anteriores nos ajudarem a compreender a gênese e significado de muitos símbolos e palavras-chave da narrativa de James, A Volta do Parafuso não se fecha apenas nisso, e a superficialidade (não intencional) de quem se aventura a escrever sobre esse romance é inevitável. Por conta de todo o jogo narrativo e interpretativo do texto, além do prazer que a leitura me ofereceu (crédito não só do autor, mas também da edição e tradução. Parabéns Hedra, Marcos Maffei e Marcelo Pen), esse livro merece (junto com Lolita de Nabokov) a nota máxima dada por esse humilde blog.
Nota do Elaphar: 10
Edição Lida:
JAMES, Henry. A Volta do Parafuso. Trad: Marcos Maffei. Introdução de Marcelo Pen. São Paulo: Hedra, 2010, 182p.
Blog criado para divulgação e resenha de livros, tanto clássicos quanto contemporâneos, tanto de literatura vernácula quanto de literatura estrangeira, tanto de literatura canônica quanto de literaturas não canônicas.
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sexta-feira, 3 de junho de 2011
domingo, 24 de abril de 2011
O Fim da Eternidade - Isaac Asimov
Aproveitando o tema da viagem no tempo e seus paradoxos (que não era clichê na época que esse livro foi escrito) Isaac Asimov escreveu O Fim da Eternidade.
Influenciado fortemente por H.G.Wells e com um certo ar de romantismo tardiu, O Fim da Eternidade é uma história de amor em um cenário de ficção científica. Diferente de tudo o que foi escrito anteriormente (e diferente do que é escrito hoje), Asimov aborda com maestria os paradoxos da viagem no tempo:
A trama envolve uma organização (a Eternidade) que faz alterações no tempo a fim de garantir a integridade da raça humana (até um certo período, pois há alguns séculos que não estão ao alcance dos Eternos). Os Técnicos são os responsáveis por essas alterações "mínimas" qua alteram toda a história humana. Há um pouco da Teoria do Caos nessa obra, porém com o acréscimo da Inércia Newtoniana, criando uma espécie de Inércia das Alterações Temporais. Uma coisa a se acostumar na leitura desse livro é a mist5ura da escrita literária com a científica (apesar dos erros).
A viajem no tempo e o romance entre Andrew Harlan (Técnico da Eternidade) e Nöys Lambert (uma pessoa normal, denominada pelos Eternos de Tempista) são aparentemente os dois principais temas do livro, mas o tema principal é outro, sutilmente colocado na obra, que é o das viagens espaciais. Não concordo com Asimov quanto a importância das viagens espaciais, mas é muito legal como esse tema é trabalhado no livro, sem ser trabalhado exatamente, pois não há viagens espaciais no livro, e essa falta é responsável pelo fim da raça humana após as "décadas ocultas".
Lastimavelmente, a técnica narrativa de Asimov é péssima no quesito descrição. As descrições do autor não são nem um pouco interessantes, apesar de toda a narrativa o ser. Ao ler o livro cheguei a conclusão de que ele seria bem melhor se fosse um conto (pela estrutura, temática e técnica do autor), e descobri que de fato era, mas recebeu acrescimos posteriores pelo autor a fim de transformá-lo num romancel. O livro provaveolmente seria melhor sem esses acréscimos.
O final interessante, apesar de pouco criativo (e do spoiler desgraçado do título) e a temática muito original e bem desenvolvida. Produção gráfica de boa qualidade e tradução fluente. Essa resenha é um Bõnus do Desafio Literário. Para conferir a lista de Abril Clique aqui. O livro pode ser encontrado facilmente em qualquer livraria, pois a edição da Aleph é recente.
Nota do Elaphar: 9,1
Edição Lida:
ASIMOV, Isaac. O Fim da Eternidade. Trad: Susana Alexandria. São Paulo: Aleph, 2007, 255p.
Influenciado fortemente por H.G.Wells e com um certo ar de romantismo tardiu, O Fim da Eternidade é uma história de amor em um cenário de ficção científica. Diferente de tudo o que foi escrito anteriormente (e diferente do que é escrito hoje), Asimov aborda com maestria os paradoxos da viagem no tempo:
[...]- Vejamos um caso mais provável e mais fácil de analisar: um homem que, em suas viagens pelo Tempo, encontra a si mesmo...Esse é apenas um dos muitos paradoxos e ciclicidades da narrativa.
- Qual é o problema de um homem encontrar a si mesmo?- perguntou Harlan, abruptamente.
[...]
- E as quatro subdivisões nas quais tal ato pode cair. Chamemos de A o homem anterior no fisiotempo, e de B o outro, posterior. Subdivisão um: A e B talvez não se vejam, nem façam
nada que vá afetar um ou outro de maneira significativa. Nesse caso, eles não se encontraram realmente; então, podemos desprezar esse caso como trivial.
- Ou o B, o indivíduo posterior, pode ver o A, mas não ser visto por ele. Aqui, também, não há por que esperar sérias consequências. B, vendo A, o vê numa posição e ocupado em alguma
atividade que ele já conhece. Não há nada de novo envolvido.
- A terceira e a quarta possibilidades são A vê B, mas B não vê A; e A e B se vêem. Em cada possibilidade, a questão séria é que A viu B; o homem, num estágio anterior em sua existência
fisiológica se vê nurn estágio posterior. Observem que ele ficou sabendo que estará vivo na idade aparente de B. Ele sabe que viverá o bastante para praticar aquela ação que testemunhou. Urn homem que conhece seu próprio futuro, em qualquer mínimo detalhe, poderá agir corn base nesse conhecimento e, portan-to, mudar seu futuro. O resultado é que a Realidade deve ser mudada o suficiente para não permitir que A e B se encontrem ou, pelo menos, para evitar que A veja B. Então, como nada que se tornou não-Real numa Realidade pode ser detectado, A nunca encontrou B. Da mesma forma, em cada aparente paradoxo da viagem no Tempo, a Realidade sempre muda para evitar o paradoxo, e chegamos à conclusão de que não há paradoxos nas viagens no Tempo e não pode haver. (p.155-156)
A trama envolve uma organização (a Eternidade) que faz alterações no tempo a fim de garantir a integridade da raça humana (até um certo período, pois há alguns séculos que não estão ao alcance dos Eternos). Os Técnicos são os responsáveis por essas alterações "mínimas" qua alteram toda a história humana. Há um pouco da Teoria do Caos nessa obra, porém com o acréscimo da Inércia Newtoniana, criando uma espécie de Inércia das Alterações Temporais. Uma coisa a se acostumar na leitura desse livro é a mist5ura da escrita literária com a científica (apesar dos erros).
A viajem no tempo e o romance entre Andrew Harlan (Técnico da Eternidade) e Nöys Lambert (uma pessoa normal, denominada pelos Eternos de Tempista) são aparentemente os dois principais temas do livro, mas o tema principal é outro, sutilmente colocado na obra, que é o das viagens espaciais. Não concordo com Asimov quanto a importância das viagens espaciais, mas é muito legal como esse tema é trabalhado no livro, sem ser trabalhado exatamente, pois não há viagens espaciais no livro, e essa falta é responsável pelo fim da raça humana após as "décadas ocultas".
Lastimavelmente, a técnica narrativa de Asimov é péssima no quesito descrição. As descrições do autor não são nem um pouco interessantes, apesar de toda a narrativa o ser. Ao ler o livro cheguei a conclusão de que ele seria bem melhor se fosse um conto (pela estrutura, temática e técnica do autor), e descobri que de fato era, mas recebeu acrescimos posteriores pelo autor a fim de transformá-lo num romancel. O livro provaveolmente seria melhor sem esses acréscimos.
O final interessante, apesar de pouco criativo (e do spoiler desgraçado do título) e a temática muito original e bem desenvolvida. Produção gráfica de boa qualidade e tradução fluente. Essa resenha é um Bõnus do Desafio Literário. Para conferir a lista de Abril Clique aqui. O livro pode ser encontrado facilmente em qualquer livraria, pois a edição da Aleph é recente.
Nota do Elaphar: 9,1
Edição Lida:
ASIMOV, Isaac. O Fim da Eternidade. Trad: Susana Alexandria. São Paulo: Aleph, 2007, 255p.
terça-feira, 12 de abril de 2011
O Homem Bicentenário - Isaac Asimov
Assimov é um escritor americano que simplesmente é considerado uma pequena divindade da Sci-fi, junto de Arthur Clark. Escreveu mais de 500 livros, dentre eles romances, contos, novelas, textos científicos e etc... O Homem Bicentenário é (provavelmente) sua obra mais conhecida, e que virou um filme bem famoso. Outras obras famosas do autor são: Eu Robô, Trilogia da Fundação, O Cair da Noite, Serie Robôs e O Fim da Eternidade.
Geralmente, quando falamos sobre um livro que virou filme espera-se uma comparação entre ambos. Procurarei evitar por dois motivos: 1º Minha sensibilidade cinematográfica não é muito boa, e 2º o filme possui pouquíssima relação com o livro. Ambos são boas obras, mas diferem-se bastante entre si.
O Homem Bicentenário foi escrito para figurar em uma antologia (referente ao bicentenário de independência dos EUA)k, mas duas coisas saíram erradas: o texto ficou duas vezes maior do que deveria e o projeto da antologia não avançou. Em contrapartida, ganhamos um dos melhores contos de Sci-fi.
Seguindo o mote das 3 leis robóticas (que não sei se surgiram em Círculo Vicioso ou Eu Robô) inicia-se o livro. Conhecemos então Andrew, um robô diferente. A família (os donos de Andrew) é composta pela mãe, o pai, e duas filhas (a mais nova o robô chama de filhinha até sua morte depois dos 80 anos). Todos gostam de Andrew, que é um verdadeiro artista e recebe bastante dinheiro, que usa para comprar sua alforria, o que deixa o pai furioso.
Após a morte do pai, Andrew passa a andar vestido, o que causa indignação geral. Acontece um terrível episódio, onde dois jovens exploram Andrew (lembre-se, as 3 leis), e faz o filho de "filhinha", que é advogado, iniciar uma movimentação judicial para proteger os robôs. Também inicia-se uma briga para que a fábrica de robôs opere modificações em Andrew, modificações essas que serão feitas por todo o livro.
Andrew escreve um BestSeller sobre robôs, e depois pesquisa ciência, criando próteses no sentido de ajudar a raça humana e se "humanizar". A luta final de Andrew é para ser oficialmente considerado "humano", que acaba conseguindo apenas com sua morte, pois a mortalidade era, em seu ponto de vista, a única diferença restante entre ele e os humanos.
O livro, apesar de seu tamanho curto é carregado de percepções sagazes do autor. O medo humano em relação aos robôs é bem colocado e explorado, além de algumas questões sociais, como do episódio dos vândalos ou a primeira aparição do advogado da família, mas principalmente nas modificações internas que ocorrem na fábrica de Robôs. Andrew não é humano, e isso é fácil de perceber no livro, pois sua personalidade não é humana, nem mesmo comparando-a com outra mais aparentada como a de Meursault (de O Estrangeiro), mas também não podemos classificar Andrew como um robô (segundo as propostas do livro). Andrew não possui o seu lugar, é um exilado, um estrangeiro.
Por fim, ao livro segue-se o conto Círculo Vicioso, que também é uma história sobre robôs (mais tradicionais), porém, Círculo Vicioso passa-se em uma exploração no planeta mercúrio. É uma excelente história, mas não é profunda psicologicamente e socialmente como O Homem Bicentenário, embora também seja escrita com maestria e coerentemente. Produção da L&PM como sempre de boa qualidade, mesmo para os livros pequenos e baratos (esse custava 5,50R$ na época). Tradução em bom vernáculo. Portanto, um excelente livro para comprar e iniciar a leitura no universo assimoveano.
Essa resenha faz parte do Desafio Literário. Para conferir a minha lista do desafio clique aqui. Para conferir a lista de Abril Clique aqui. O livro pode ser encontrado facilmente em qualquer livraria, afinal, é um best Seller.
Nota do Elaphar: 9,0
Edição Lida:
ASSIMOV, Isaac. O Homem Bicentenário. Trad: Milton Persson. Porto Alegre: L&PM, 1997, 120p. (Coleção L&PM Pocket; v.57)
Geralmente, quando falamos sobre um livro que virou filme espera-se uma comparação entre ambos. Procurarei evitar por dois motivos: 1º Minha sensibilidade cinematográfica não é muito boa, e 2º o filme possui pouquíssima relação com o livro. Ambos são boas obras, mas diferem-se bastante entre si.
O Homem Bicentenário foi escrito para figurar em uma antologia (referente ao bicentenário de independência dos EUA)k, mas duas coisas saíram erradas: o texto ficou duas vezes maior do que deveria e o projeto da antologia não avançou. Em contrapartida, ganhamos um dos melhores contos de Sci-fi.
Seguindo o mote das 3 leis robóticas (que não sei se surgiram em Círculo Vicioso ou Eu Robô) inicia-se o livro. Conhecemos então Andrew, um robô diferente. A família (os donos de Andrew) é composta pela mãe, o pai, e duas filhas (a mais nova o robô chama de filhinha até sua morte depois dos 80 anos). Todos gostam de Andrew, que é um verdadeiro artista e recebe bastante dinheiro, que usa para comprar sua alforria, o que deixa o pai furioso.
Após a morte do pai, Andrew passa a andar vestido, o que causa indignação geral. Acontece um terrível episódio, onde dois jovens exploram Andrew (lembre-se, as 3 leis), e faz o filho de "filhinha", que é advogado, iniciar uma movimentação judicial para proteger os robôs. Também inicia-se uma briga para que a fábrica de robôs opere modificações em Andrew, modificações essas que serão feitas por todo o livro.
Andrew escreve um BestSeller sobre robôs, e depois pesquisa ciência, criando próteses no sentido de ajudar a raça humana e se "humanizar". A luta final de Andrew é para ser oficialmente considerado "humano", que acaba conseguindo apenas com sua morte, pois a mortalidade era, em seu ponto de vista, a única diferença restante entre ele e os humanos.
O livro, apesar de seu tamanho curto é carregado de percepções sagazes do autor. O medo humano em relação aos robôs é bem colocado e explorado, além de algumas questões sociais, como do episódio dos vândalos ou a primeira aparição do advogado da família, mas principalmente nas modificações internas que ocorrem na fábrica de Robôs. Andrew não é humano, e isso é fácil de perceber no livro, pois sua personalidade não é humana, nem mesmo comparando-a com outra mais aparentada como a de Meursault (de O Estrangeiro), mas também não podemos classificar Andrew como um robô (segundo as propostas do livro). Andrew não possui o seu lugar, é um exilado, um estrangeiro.
Por fim, ao livro segue-se o conto Círculo Vicioso, que também é uma história sobre robôs (mais tradicionais), porém, Círculo Vicioso passa-se em uma exploração no planeta mercúrio. É uma excelente história, mas não é profunda psicologicamente e socialmente como O Homem Bicentenário, embora também seja escrita com maestria e coerentemente. Produção da L&PM como sempre de boa qualidade, mesmo para os livros pequenos e baratos (esse custava 5,50R$ na época). Tradução em bom vernáculo. Portanto, um excelente livro para comprar e iniciar a leitura no universo assimoveano.
Essa resenha faz parte do Desafio Literário. Para conferir a minha lista do desafio clique aqui. Para conferir a lista de Abril Clique aqui. O livro pode ser encontrado facilmente em qualquer livraria, afinal, é um best Seller.
Nota do Elaphar: 9,0
Edição Lida:
ASSIMOV, Isaac. O Homem Bicentenário. Trad: Milton Persson. Porto Alegre: L&PM, 1997, 120p. (Coleção L&PM Pocket; v.57)
domingo, 3 de abril de 2011
Do Jeito Delas: vozes femininas de língua inglesa - Trad: Jorge Wanderley
Essa antologia foi fundada a partir de três afinidades: as escritoras são mulheres, de língua inglesa e foram traduzidas por Jorge Wanderley. Para quem não conhece, Jorge Wanderley foi um grande tradutor brasileiro (falecido em 1999), que traduziu os 154 Sonetos de Shakespeare, o Inferno de Dante, o Corvo de Poe e várias antologias de poetas anglófonos, além de sua obra como poeta. Em suas antologias, não costumava diferenciar homens e mulheres, entretanto, esta antologia póstuma contém apenas mulheres.
Mais do que simples questões de gênero puramente ditas, há um fio que conduz a poesia dessas mulheres, que é o que o grande Camus chamaria de Absurdo; essas mulheres são extremamente consientes do absurdo da existência.
O que me chamou a atenção nesse volume foi a quantidade de nomes desconhecidos. Exceto Plath, Sexton e Dickson (além de já ter ouvido Bishop, sem nunca ler nada de sua obra), nenhum outro nome me soava meramente familiar. São ao todo 12 poetas (18 poesias), com suas poesias muito bem traduzidas e 3 excelentes ensaios sobre a biografia e poética das escritoras. Apesar de poucas poesias, os maravilhosos ensaios valem a pena.
Falando das poesias: a maioria delas possui um nível de obscuridade que as torna impenetrável.
Sylvia Plath é de longe (junto de Dickinson) a mais conhecida, e sua poética é bastante peculiar. Colher Amoras [Blackberrying] e Outono de Rã [Frog Autumm] são poesias tão diferentes entre si que dariam todo um ensaio. Se você não conhece Plath, deve conhecê-la. Já Anne Sexton, que conhecia mas não apreciava, me surpreendeu com o A Mulher do Fazendeiro [The Farmer's Wife], que é simplesmente a melhor poesia do livro (apesar de ser também a tradução mais "fraca"). Vou passar a ler a poesia de Sexton.
Emiy Dickinson está em extrema moda nos últimos dias, possuindo fans incondicionais. Recentemente ganhou uma grande coleção traduzida por José Lira. Geralmente conhecida como "poeta para poetas", seu estilo é inovador em todos os sentidos. Seus poemas curtos e concisos ficam entre o compreensível e o incompreensível. Mas não se engane, traduzir Dickinson não é uma tarefa fácil.
Quanto às outras poetas, poucas chamam atenção, e entre elas inclui-se Marianne Moore (com Poesia e Que são os Anos), Louise Bogan (com fragmentos de Segundo o Persa) e Denise Levertov (com O Segredo). As outras traduções são boas, mas as poesias pouco me cativaram, exceto as já citadas.
Como falei, os ensaios são excelentes, nos mostrando o lado biográfico e a obra poetica de todas as escritoras. A produção gráfica da 7Letras é outra obra de arte a parte. Capa, orelha, lombada, tudo excelente, em ótimo papel pólem de 90g/m².
Mais do que simples questões de gênero puramente ditas, há um fio que conduz a poesia dessas mulheres, que é o que o grande Camus chamaria de Absurdo; essas mulheres são extremamente consientes do absurdo da existência.
O que me chamou a atenção nesse volume foi a quantidade de nomes desconhecidos. Exceto Plath, Sexton e Dickson (além de já ter ouvido Bishop, sem nunca ler nada de sua obra), nenhum outro nome me soava meramente familiar. São ao todo 12 poetas (18 poesias), com suas poesias muito bem traduzidas e 3 excelentes ensaios sobre a biografia e poética das escritoras. Apesar de poucas poesias, os maravilhosos ensaios valem a pena.
Falando das poesias: a maioria delas possui um nível de obscuridade que as torna impenetrável.
Sylvia Plath é de longe (junto de Dickinson) a mais conhecida, e sua poética é bastante peculiar. Colher Amoras [Blackberrying] e Outono de Rã [Frog Autumm] são poesias tão diferentes entre si que dariam todo um ensaio. Se você não conhece Plath, deve conhecê-la. Já Anne Sexton, que conhecia mas não apreciava, me surpreendeu com o A Mulher do Fazendeiro [The Farmer's Wife], que é simplesmente a melhor poesia do livro (apesar de ser também a tradução mais "fraca"). Vou passar a ler a poesia de Sexton.
Emiy Dickinson está em extrema moda nos últimos dias, possuindo fans incondicionais. Recentemente ganhou uma grande coleção traduzida por José Lira. Geralmente conhecida como "poeta para poetas", seu estilo é inovador em todos os sentidos. Seus poemas curtos e concisos ficam entre o compreensível e o incompreensível. Mas não se engane, traduzir Dickinson não é uma tarefa fácil.
Quanto às outras poetas, poucas chamam atenção, e entre elas inclui-se Marianne Moore (com Poesia e Que são os Anos), Louise Bogan (com fragmentos de Segundo o Persa) e Denise Levertov (com O Segredo). As outras traduções são boas, mas as poesias pouco me cativaram, exceto as já citadas.
Como falei, os ensaios são excelentes, nos mostrando o lado biográfico e a obra poetica de todas as escritoras. A produção gráfica da 7Letras é outra obra de arte a parte. Capa, orelha, lombada, tudo excelente, em ótimo papel pólem de 90g/m².
segunda-feira, 21 de março de 2011
Fernão Capelo Gaivota (Jonathan Livingston Seagull) - Richard Bach
Fernão Capelo Gaivota (Jonathan Livingston Seagull) é um BestSeller americano escrito pelo piloto/escritor Richard Bach. Todos os livros de Bach envolvem (direta ou indiretamente) o voo, e Fernão Capelo Gaivota não é diferente. Vendeu milhares de cópias, foi publicado em diversos países, ganhando inumeras traduções; sorte que os outros livros do autor não tiveram. O Brasil traduziu mais da metade das obras do escritor, mas ainda há livros inéditos. Alguns devem se perguntar porque coloquei o título em português e inglês, se não tenho o hábito de fazê-lo. Irei responder em breve.
A primeira impressão que tive ao ler esse livro foi: Tem alguma coisa errada com essa tradução! Como estava sem computador, continuei a leitura normalmente, mas hoje li parcialmente (mais da metade do livro) a versão britânica (da Element, daí o título nas duas línguas), e aí cheguei a uma nova conclusão: não havia nada de errado com a tradução! o livro é isso mesmo. Não consigo entender o porquê do sucesso do livro. Não há nada de mais nele.
A história é uma grande fábula, que conta a história de Fernão Capelo (ou Jonathan Livingston), que é uma gaivota ansiosa por "aprender" a voar, e é banida por suas atitudes. Minha primeira crítica contra essa obra é quanto a linguagem utilizada. Muito do que está escrito no livro é completamente inútil para a própria compreensão da obra, isto é, há muitas passagens que não são essenciais. Ainda tratando da linguagem, muitas imagens evocadas por Bach são ridículas, distoantes do contexto original, e muitas vezes ele cria aforismos de péssima qualidade.
Muitos consideram Fernão Capelo Gaivota (Jonathan Livingston Seagull) como obra filosófica e seu escritor como um grande filósofo, mas isso está muito longe de se aproximar da verdade. De fato, há filosofia presente em FCG (JLS), mas não a filosofia de Bach, mas sim um tipo de neoplatonismo "popular", no que se refere à ilusão do mundo sensível e às ideias geradoras. Provavelmente (esse é uma opinião minha), Richard Bach conheceu platão a partir da filosofia escolástica agostiniana, pois suas ideias estão repletas de Agostinho de Hipona, mas de uma forma ou de outra, Bach não dialoga com a filosofia, mas sim acrescenta-a ao seu livro de forma bastante vulgar (como é usada por Bach [ordinary], no sentido de comum). Jamais posso considerar Bach como filósofo, pois a filosofia presente no livro é reproduzida e não desenvolvida.
Ainda detonando o livro, além da linguagem, da acriatividade e da "filosofia" do livro, a história não me cativou nem um pouco. O espaço da narrativa é pobre até mesmo para a proposta do livro (de simplicidade e pouca descritividade), a narração é fraca e malfeita (em decorrencia da linguagem) e os personagens são péssimos estereótipos, retirados da bíblia cristã. Bach propõe um Fernão "quase-profeta", mas diferente dos livros sagrados, carece de uma boa psicologia em sua criação. Comparando a psicologia de Jonas, Daniel ou Paulo com Fernão vemos o quanto Bach foi infeliz em sua criação (isso considerando os Jonas, Daniel e Paulo como PERSONAGENS e seus textos como CRIAÇÃO LITERÁRIA). Creio que a pouca descritividade dos ambientes também decorra de influência do Tanakh, mas novamente foi infeliz. O que é descrito por Bach geralmente é desnecessário. E por fim, a tradução brasileira em alguns momentos gera passagens que parecem de um português alienígena.
Agor a, vou falar um pouco das coisas boas do livro. A linguagem (mesmo ruim) é simples, e permite uma leitura rápida e sem ter de repetir pontos do livro (como em uma leitura mais elaborada, como Ulysses). O livro é curtíssimo, pequeno, com margens e fonte grande e com páginas e páginas de fotos, o que permite que eu afirme que não perdi nem uma hora do meu tempo lendo esse livro. As fotos (para quem é fã da arte da fotografia) de Russell Munson são muito boas, e a tradução é competente (apesar de umas passagens ou outras serem esquisitas). É um livro que não possui nada de mais, e, entre esse e Ilusões (do mesmo autor), fico com o segundo. Em breve resenho Ilusões.
Essa resenha faz parte do Desafio Literário. Para conferir a minha lista do desafio clique aqui. Para conferir a lista de Março Clique aqui.
Nota do Elaphar: 7,3
Edições Lidas:
BACH, Richard. Fernão Capelo Gaivota. Fotografias de Russell Munson. Trad: Antônio Ramos Rosa e Madalena Rosález. Rio de Janeiro: Nórdica, [s/d], 152p.
BACH, Richard. Jonathan Livingston Seagull. Photography by Russell Munson. Hammersmith[London]: Element Press, 2003.
A primeira impressão que tive ao ler esse livro foi: Tem alguma coisa errada com essa tradução! Como estava sem computador, continuei a leitura normalmente, mas hoje li parcialmente (mais da metade do livro) a versão britânica (da Element, daí o título nas duas línguas), e aí cheguei a uma nova conclusão: não havia nada de errado com a tradução! o livro é isso mesmo. Não consigo entender o porquê do sucesso do livro. Não há nada de mais nele.
A história é uma grande fábula, que conta a história de Fernão Capelo (ou Jonathan Livingston), que é uma gaivota ansiosa por "aprender" a voar, e é banida por suas atitudes. Minha primeira crítica contra essa obra é quanto a linguagem utilizada. Muito do que está escrito no livro é completamente inútil para a própria compreensão da obra, isto é, há muitas passagens que não são essenciais. Ainda tratando da linguagem, muitas imagens evocadas por Bach são ridículas, distoantes do contexto original, e muitas vezes ele cria aforismos de péssima qualidade.
A mile from shore a fishing boat chummed the water, and the word for Breakfast Flock flashed through the air, till a crowd of a thousand seagulls came to dodge and fight for bits of food. It was another busy day beginning.A história não é original, mas não é de todo ruim. É uma fábula (com acréscimos desnecessários, mais ainda assim fábula) como outra qualquer, incluindo a questão moralizante. Não sou fã de literatura com finalidade moralizante, mas também não tenho nada contra elas.
Muitos consideram Fernão Capelo Gaivota (Jonathan Livingston Seagull) como obra filosófica e seu escritor como um grande filósofo, mas isso está muito longe de se aproximar da verdade. De fato, há filosofia presente em FCG (JLS), mas não a filosofia de Bach, mas sim um tipo de neoplatonismo "popular", no que se refere à ilusão do mundo sensível e às ideias geradoras. Provavelmente (esse é uma opinião minha), Richard Bach conheceu platão a partir da filosofia escolástica agostiniana, pois suas ideias estão repletas de Agostinho de Hipona, mas de uma forma ou de outra, Bach não dialoga com a filosofia, mas sim acrescenta-a ao seu livro de forma bastante vulgar (como é usada por Bach [ordinary], no sentido de comum). Jamais posso considerar Bach como filósofo, pois a filosofia presente no livro é reproduzida e não desenvolvida.
Ainda detonando o livro, além da linguagem, da acriatividade e da "filosofia" do livro, a história não me cativou nem um pouco. O espaço da narrativa é pobre até mesmo para a proposta do livro (de simplicidade e pouca descritividade), a narração é fraca e malfeita (em decorrencia da linguagem) e os personagens são péssimos estereótipos, retirados da bíblia cristã. Bach propõe um Fernão "quase-profeta", mas diferente dos livros sagrados, carece de uma boa psicologia em sua criação. Comparando a psicologia de Jonas, Daniel ou Paulo com Fernão vemos o quanto Bach foi infeliz em sua criação (isso considerando os Jonas, Daniel e Paulo como PERSONAGENS e seus textos como CRIAÇÃO LITERÁRIA). Creio que a pouca descritividade dos ambientes também decorra de influência do Tanakh, mas novamente foi infeliz. O que é descrito por Bach geralmente é desnecessário. E por fim, a tradução brasileira em alguns momentos gera passagens que parecem de um português alienígena.
Agor a, vou falar um pouco das coisas boas do livro. A linguagem (mesmo ruim) é simples, e permite uma leitura rápida e sem ter de repetir pontos do livro (como em uma leitura mais elaborada, como Ulysses). O livro é curtíssimo, pequeno, com margens e fonte grande e com páginas e páginas de fotos, o que permite que eu afirme que não perdi nem uma hora do meu tempo lendo esse livro. As fotos (para quem é fã da arte da fotografia) de Russell Munson são muito boas, e a tradução é competente (apesar de umas passagens ou outras serem esquisitas). É um livro que não possui nada de mais, e, entre esse e Ilusões (do mesmo autor), fico com o segundo. Em breve resenho Ilusões.
Essa resenha faz parte do Desafio Literário. Para conferir a minha lista do desafio clique aqui. Para conferir a lista de Março Clique aqui.
Nota do Elaphar: 7,3
Edições Lidas:
BACH, Richard. Fernão Capelo Gaivota. Fotografias de Russell Munson. Trad: Antônio Ramos Rosa e Madalena Rosález. Rio de Janeiro: Nórdica, [s/d], 152p.
BACH, Richard. Jonathan Livingston Seagull. Photography by Russell Munson. Hammersmith[London]: Element Press, 2003.
sábado, 29 de janeiro de 2011
Graham Greene - O Terceiro Homem
O Terceiro Homem não é exatamente um livro, mas sim um roteiro para um filme homônimo. Segundo o escritor, Carol Reed chamou Greene para fazer um roteiro, e o autor escreveu primeiro em formato de livro, e acompanhou todos os processos de adaptação do texto literário para o filme. Esse filme foi um sucesso na época (1949), e foi remasterizado recentemente (2000). Não assisti o filme, mas deve serexcelente, não por ter ganhado um oscar, mas por ter ganhado o Festival de Cannes, e esse é um prêmio que, em geral, não decepciona.
Mas não viemos falar do filme e sim do livro.A primeira vantagem é quanto à produção da L&PM Editores. Esse livro em formato de bolso está (aparentemente) em ótima tradução e revisão; e o melhor de todos, num preço ótimo (8 R$ na Saraiva). A capa não foi muito agradável aos meus olhos, mas a lombada combina muito bem com meus outros livros da L&PM Pocket Plus (como Zweig, Fitzgerald, Dickson, Rilke e etc...).
A história é simples e movimentada, afinal, não se espera menos de um filme. O cenário é Viena dividida depois da Grande Depressão, onde todas as pessoas cometem atitudes corruptas, algumas mais inocentes e outras menos. O tipo de crime que a narrativa massacra é o da venda e adulteramento da penicilina, fato real que destruiu muitas vidas vienenses. O narrador é um policial que narra a partir do dia que conheceu Rollo Martins (no filme esse personagem possui outro nome), o protagonista do filme.
A história começa com a morte de Harry Lime, amigo de Rollo e que o leva para Viena. A partir desse acontecimento, Rollo se nega a aceitar que a morte do amigo é um acidente, e decide investigar o caso por caso por conta própria. Por conta de um problema com nome, Rollo acaba se fazendo passar por um escritor famoso chamado Benjamin Dexter (Rollo também é um escritor, mas ordinário, que assina como B. Dexter), embora faça isso sem a intenção e acaba causando algumas confusões na narrativa.
Nota do Elaphar: 8,6
Edição Lida:
GREENE, Graham. O Terceiro Homem. Trad: Antônio Celso Nogueira. Porto Alegre: L&PM, 2007, 128p. (L&PM Pocket Plus, 590)
Mas não viemos falar do filme e sim do livro.A primeira vantagem é quanto à produção da L&PM Editores. Esse livro em formato de bolso está (aparentemente) em ótima tradução e revisão; e o melhor de todos, num preço ótimo (8 R$ na Saraiva). A capa não foi muito agradável aos meus olhos, mas a lombada combina muito bem com meus outros livros da L&PM Pocket Plus (como Zweig, Fitzgerald, Dickson, Rilke e etc...).
A história é simples e movimentada, afinal, não se espera menos de um filme. O cenário é Viena dividida depois da Grande Depressão, onde todas as pessoas cometem atitudes corruptas, algumas mais inocentes e outras menos. O tipo de crime que a narrativa massacra é o da venda e adulteramento da penicilina, fato real que destruiu muitas vidas vienenses. O narrador é um policial que narra a partir do dia que conheceu Rollo Martins (no filme esse personagem possui outro nome), o protagonista do filme.
A história começa com a morte de Harry Lime, amigo de Rollo e que o leva para Viena. A partir desse acontecimento, Rollo se nega a aceitar que a morte do amigo é um acidente, e decide investigar o caso por caso por conta própria. Por conta de um problema com nome, Rollo acaba se fazendo passar por um escritor famoso chamado Benjamin Dexter (Rollo também é um escritor, mas ordinário, que assina como B. Dexter), embora faça isso sem a intenção e acaba causando algumas confusões na narrativa.
Alerta!!! Esse texto pode conter spoilers como o fato de que Lime é um pilantra que forjou a própria morte para fugir da polícia e é morto (de verdade) pelo seu amigo Rollo.Durante a investigação, Rollo encontra coisas muito extranhas e conflitantes, até que ele descobre que Harry não morreu. Com a ajuda da polícia, Martins cria uma emboscada para Lime e acaba matando-o pessoalmente. Como eu disse, é uma história muito ágil, e até certo ponto interessante (levando em consideração que não sou muito fã do gênero, até gostei). Há uma história paralela de romance e uma forte presença política e histórica no livro. Há também (segundo minha análise) uma leve pítada de crítica contra a teoria literária da época, voltada apenas para o Cânone e que considerava a "literatura de entretenimento" como um lixo. De resto, é uma novela bem curta e ágil, que dá para ser lida de uma só vez no ônibus ou no intervalo do almoço.
Nota do Elaphar: 8,6
Edição Lida:
GREENE, Graham. O Terceiro Homem. Trad: Antônio Celso Nogueira. Porto Alegre: L&PM, 2007, 128p. (L&PM Pocket Plus, 590)
quarta-feira, 26 de janeiro de 2011
F. Scott Fitzgerald - O Grande Gatsby
Esse livro foi selecionado (e lido) para o Desafio Literário do mês de Janeiro, com a temática: Literatura Infanto Juvenil. Fitzgerald é também a celebridade do ano (junto com Benjamin e Klee) que entrou em domínio público, e, portanto, sua obra está disponível no projeto Gutenberg. Antes que me matem e me apedrejem afirmando que "O Grande Gatsby" não é infanto-juvenil, deixem-me explicar o motivo de minha escolha.
Primeiro, devemos compreender o termo "Literatura Infanto-Juvenil" (doravante LIJ). Ao fazer um pouco de pesquisa, percebemos que é uma construção recente (tá legal, não tão recente assim, mas remonta o romantismo), e que até um certo ponto da história literária, não se diferenciava a literatura para crianças, jovens e adutos, ou para homens e mulheres (a construção da literatura de "gênero" é ainda mais recente).
Outro ponto que devemos ter em vista, é que a LIJ também se define históricamente. Por exemplo, os Brüder Grimm ao construirem seu Kinder und Hausmärchen, não se preocuparam em criar uma literatura para crianças, mas sim compilar as narrativas orais alemãs com a finalidade de definir uma identidade (desculpe, sei que o exemplo dos Grimm já está ficando batido). Outros textos, escritos para crianças (portanto, LIJ de origem), perderam sua propriedade e se transformaram em livros para adultos, dentre eles Alice no País das Maravilhas, que é lido hoje como um livro adulto, e talvez até de difícil compreensão para uma criança (pelo menos em língua portuguesa). Há livros também que ficam em um meio termo, como O Hobbit de Tolkien, O barão nas Árvores de Calvino, e as A Volta ao Mundo em 80 Dias de Verne. É importante não confundir a temática do fantástico e do maravilhoso (sim, são coisas diferentes) com LIJ, pois há obras de LIJ sem a temática do fantástico, embora não atraia tanto, e há obras se utilizando do fantástico e maravilhoso que não são LIJ.
Há ainda uma outra tendência, quando um crítico ou educador acha apropriado considerar um texto "de peso" como adequado para crianças. Há até uma seleção de poesias clássicas da literatura portuguesa compiladas em um livro infanto-juvenil (se não me engano, editado pela Companhia das Letras), onde encontra-se até mesmo um poema de Machado de Assis e Bilac... isso mesmo! Bilac. Bloom também cria uma seleção de "Textos para crianças inteligentes de todas as idades" (ou algo assim) lançado no Brasil pela objetiva, e onde há apenas textos clássicos. Notem, que nesses casos, não há adaptação (é diferente de obras adaptadas para crianças, como da coleção Literatura em Minha Casa), o que acontece é uma diferença nos pontos de vista do que é "apropriado" para crianças ou não. Lembrando que a LIJ é dividida em duas partes (uma infantil e a outra juvenil).
Mas e onde entra "O Grande Gatsby" nisso? Simples. O romance foi escrito no fim da década de10 do século XX, após a primeira guerra mundial. O mundo se afogava em uma crise (que ficou ainda mais grave na década de 30), e as pessoas estavam se tornando vazias, as relações fúteis e etc... os jovens dessa época foram nomeados de "a geração perdida". Cada época possui suas fórmulas, e se hoje, a fórmula para vender para os jovens é socar monstros como zumbis e vampiros ou criar histórias de amor pouco ortodoxas, naquela época era mostrar a sociedade burguesa jovem ou jovem-adulta mergulhar em um vazio existencial. Essa era a "fórmula" da época, e Fitzgerald escreveu seu livro em cima deste motivo, e portanto, guiou sua voz para os jovens (de 16-20 anos), e portanto, fez uma literatura Juvenil, ramo da LIJ. Eu procuro, nas minhas escolhas para o desafio, colocar o que há de mais variado no tema tratado (ou melhor, o que acho que é, afinal, não leio os livros antes). Ao escolher Memórias do Quintal, O Castelo nos Pirineus e O Guia dos Mochileiros da Galáxia, escolhi fazer um passeio pela faixa etária (criança, pré-adolescência e adolescência), e um passeio temático (histórias quotidianas, estranhas e reflexivas, e fantásticas e sem propósito intelectual). Claro, não saí exatamente do que planejei, pois, O Castelo nos Pirineus não foi o que esperava, e O Guia foi extraviado. Com Fitzgerald acho que posso prosseguir meu objetivo com sucesso. Agora chega de me explicar e vamos para a parte mais divertida da obra.
Se por um lado eu falei que "O Grande Gatsby" seguia uma "fórmula" da época, porque o livro é considerado uma obra prima, já que a história mostra que obras que seguem fórmulas não vão para a história da literatura? (Tá legal, algumas vão, como Prosopopéia de Bento Teixeira ou O Guarani de José de Alencar) A esplicação é apenas uma: a obra é genial.
Diferente do que possa-se imaginar, Fitzgerald desenvolve o tema da futilidade e vácuo interior com uma maestria surpreendente. Os personagens de "O Grande Gatsby" são extremamente vazios, mas não no sentido que usei ao falar dos personagens de "O Castelo nos Pirineus", mas no sentido de que são magnificamente vazios, ou brilhantemente construídos vazios, sem nem uma marca de estereotipação exagerada. Não há exagero de descrissões dos personagens, mas a partir de suas ações podemos ver seus traços comportamenteis, e todos os personagens são surpreendentes e bem escritos. O estilo de Fitzgerald lembra (em alguns momentos apenas) o de Clarice Lispector, com a diferença que a ultima trabalha com reflexões internas e a surpresa com o quotidiano, enquanto aquele se foca no vazio do quotidiano e a falta da reflexão (direta). Em ambos os escritores, de qualquer modo, o não dito e não acontecido se faz mais forte do que o dito e vivenciado.
O narrador do livro é Rick, que é visinho de Gatsby. Conhece Tom e seu círculo de amizade, e posteriormente, entra em contato com Gatsby. Gatsby é um cara rico, esquisito e extravagante, que tem uma paixão antiga e sem sentido por Daisy (esposa de Tom e amiga de Rick). A riquesa de Gatsby vem de negócios ilegais.
Há no livro muitos pontos positivos, mas não quero estragar a surpresa da leitura (embora já tenha feito um spoiler desgraçado da maior parte dos fatos que demoram para serem descobertos). "O Grande Gatsby" em tudo o que lhe falta proporciona a um leitor diversas emoções: interesse, compaixão, incompreensão, revolta e etc... Seu desfecho trágico e suas temáticas do amor (tratado de formas diferentes, todas incomuns) e do relacionamento social são excelentes atrativos para uma leitura divertida e descompromissada, enquanto sua densidade artística são perfeitas para uma análise ou leitura mais aprofundada.
Quanto à produção editorial, meu exemplar da Abril é um livro bem comum, com bom acabamento. A revisão foi bem feita e a tradução parece ótima (está em bom vernáculo). Não me dei ao trabalho de ler a versão em inglês do livro (minha preguiça e vontade de ler outros livros não permitiu), mas não acho nem que isso seja nescessário, pois, a edição é traduzida por ninguem menos que Brenno Silveira. Para quem não sabe, Brenno Silveira é um nome respeitadíssimo na tradução em vernáculo, além de ter escrito um dos primeiros livros sobre tradução no brasil (A Arte de Traduzir). É considerado uma grande referência na arte tradutória. Como esse post faz parte do Desafio Literário, para conferir a minha lista do desafio clique aqui. Para conferir a lista de Janeiro Clique aqui.
Nota do Elaphar: 9,2
Edição Lida:
FITZGERALD, F. Scott. O Grande Gatsby. Tradução de Brenno Silveira. São Paulo: Abril Cultural, 1980.
Primeiro, devemos compreender o termo "Literatura Infanto-Juvenil" (doravante LIJ). Ao fazer um pouco de pesquisa, percebemos que é uma construção recente (tá legal, não tão recente assim, mas remonta o romantismo), e que até um certo ponto da história literária, não se diferenciava a literatura para crianças, jovens e adutos, ou para homens e mulheres (a construção da literatura de "gênero" é ainda mais recente).
Outro ponto que devemos ter em vista, é que a LIJ também se define históricamente. Por exemplo, os Brüder Grimm ao construirem seu Kinder und Hausmärchen, não se preocuparam em criar uma literatura para crianças, mas sim compilar as narrativas orais alemãs com a finalidade de definir uma identidade (desculpe, sei que o exemplo dos Grimm já está ficando batido). Outros textos, escritos para crianças (portanto, LIJ de origem), perderam sua propriedade e se transformaram em livros para adultos, dentre eles Alice no País das Maravilhas, que é lido hoje como um livro adulto, e talvez até de difícil compreensão para uma criança (pelo menos em língua portuguesa). Há livros também que ficam em um meio termo, como O Hobbit de Tolkien, O barão nas Árvores de Calvino, e as A Volta ao Mundo em 80 Dias de Verne. É importante não confundir a temática do fantástico e do maravilhoso (sim, são coisas diferentes) com LIJ, pois há obras de LIJ sem a temática do fantástico, embora não atraia tanto, e há obras se utilizando do fantástico e maravilhoso que não são LIJ.
Há ainda uma outra tendência, quando um crítico ou educador acha apropriado considerar um texto "de peso" como adequado para crianças. Há até uma seleção de poesias clássicas da literatura portuguesa compiladas em um livro infanto-juvenil (se não me engano, editado pela Companhia das Letras), onde encontra-se até mesmo um poema de Machado de Assis e Bilac... isso mesmo! Bilac. Bloom também cria uma seleção de "Textos para crianças inteligentes de todas as idades" (ou algo assim) lançado no Brasil pela objetiva, e onde há apenas textos clássicos. Notem, que nesses casos, não há adaptação (é diferente de obras adaptadas para crianças, como da coleção Literatura em Minha Casa), o que acontece é uma diferença nos pontos de vista do que é "apropriado" para crianças ou não. Lembrando que a LIJ é dividida em duas partes (uma infantil e a outra juvenil).
Mas e onde entra "O Grande Gatsby" nisso? Simples. O romance foi escrito no fim da década de10 do século XX, após a primeira guerra mundial. O mundo se afogava em uma crise (que ficou ainda mais grave na década de 30), e as pessoas estavam se tornando vazias, as relações fúteis e etc... os jovens dessa época foram nomeados de "a geração perdida". Cada época possui suas fórmulas, e se hoje, a fórmula para vender para os jovens é socar monstros como zumbis e vampiros ou criar histórias de amor pouco ortodoxas, naquela época era mostrar a sociedade burguesa jovem ou jovem-adulta mergulhar em um vazio existencial. Essa era a "fórmula" da época, e Fitzgerald escreveu seu livro em cima deste motivo, e portanto, guiou sua voz para os jovens (de 16-20 anos), e portanto, fez uma literatura Juvenil, ramo da LIJ. Eu procuro, nas minhas escolhas para o desafio, colocar o que há de mais variado no tema tratado (ou melhor, o que acho que é, afinal, não leio os livros antes). Ao escolher Memórias do Quintal, O Castelo nos Pirineus e O Guia dos Mochileiros da Galáxia, escolhi fazer um passeio pela faixa etária (criança, pré-adolescência e adolescência), e um passeio temático (histórias quotidianas, estranhas e reflexivas, e fantásticas e sem propósito intelectual). Claro, não saí exatamente do que planejei, pois, O Castelo nos Pirineus não foi o que esperava, e O Guia foi extraviado. Com Fitzgerald acho que posso prosseguir meu objetivo com sucesso. Agora chega de me explicar e vamos para a parte mais divertida da obra.
Se por um lado eu falei que "O Grande Gatsby" seguia uma "fórmula" da época, porque o livro é considerado uma obra prima, já que a história mostra que obras que seguem fórmulas não vão para a história da literatura? (Tá legal, algumas vão, como Prosopopéia de Bento Teixeira ou O Guarani de José de Alencar) A esplicação é apenas uma: a obra é genial.
Diferente do que possa-se imaginar, Fitzgerald desenvolve o tema da futilidade e vácuo interior com uma maestria surpreendente. Os personagens de "O Grande Gatsby" são extremamente vazios, mas não no sentido que usei ao falar dos personagens de "O Castelo nos Pirineus", mas no sentido de que são magnificamente vazios, ou brilhantemente construídos vazios, sem nem uma marca de estereotipação exagerada. Não há exagero de descrissões dos personagens, mas a partir de suas ações podemos ver seus traços comportamenteis, e todos os personagens são surpreendentes e bem escritos. O estilo de Fitzgerald lembra (em alguns momentos apenas) o de Clarice Lispector, com a diferença que a ultima trabalha com reflexões internas e a surpresa com o quotidiano, enquanto aquele se foca no vazio do quotidiano e a falta da reflexão (direta). Em ambos os escritores, de qualquer modo, o não dito e não acontecido se faz mais forte do que o dito e vivenciado.
Alerta!!! Esse texto pode conter spoilers como o fato de que Gatsby enriqueceu de formas ilícitas e quando morre ninguem se preocupa com ele. Ou que a amisade entre Tom e Rick se evanesce.A história é tensa, apesar de toda a sua loentidão. Por lentidão, entenda-se uma história onde a tensão ocorre mais pelos estados de espírito e reflexões do que pelos acontecimentos em si (e, pensando bem, os 3 livros desse mês são narrativas lentas, o que me mostra como tenho preferencia por esse tipo de narrativa). A narrativa nos dá a cada instante, um sentimento de desconforto. Parece que estamos vendo um mundo alienígena, que é nosso próprio. Há momentos na narrativa que são bem mais ágeis, principalmente após o (re)encontro de Gatsby com Daisy. Essa agilidade vai até a morte de Gatsby, quando a narrativa retoma seu ar mórbido e vagaroso, porém ainda assim tenso.
O narrador do livro é Rick, que é visinho de Gatsby. Conhece Tom e seu círculo de amizade, e posteriormente, entra em contato com Gatsby. Gatsby é um cara rico, esquisito e extravagante, que tem uma paixão antiga e sem sentido por Daisy (esposa de Tom e amiga de Rick). A riquesa de Gatsby vem de negócios ilegais.
Há no livro muitos pontos positivos, mas não quero estragar a surpresa da leitura (embora já tenha feito um spoiler desgraçado da maior parte dos fatos que demoram para serem descobertos). "O Grande Gatsby" em tudo o que lhe falta proporciona a um leitor diversas emoções: interesse, compaixão, incompreensão, revolta e etc... Seu desfecho trágico e suas temáticas do amor (tratado de formas diferentes, todas incomuns) e do relacionamento social são excelentes atrativos para uma leitura divertida e descompromissada, enquanto sua densidade artística são perfeitas para uma análise ou leitura mais aprofundada.
Quanto à produção editorial, meu exemplar da Abril é um livro bem comum, com bom acabamento. A revisão foi bem feita e a tradução parece ótima (está em bom vernáculo). Não me dei ao trabalho de ler a versão em inglês do livro (minha preguiça e vontade de ler outros livros não permitiu), mas não acho nem que isso seja nescessário, pois, a edição é traduzida por ninguem menos que Brenno Silveira. Para quem não sabe, Brenno Silveira é um nome respeitadíssimo na tradução em vernáculo, além de ter escrito um dos primeiros livros sobre tradução no brasil (A Arte de Traduzir). É considerado uma grande referência na arte tradutória. Como esse post faz parte do Desafio Literário, para conferir a minha lista do desafio clique aqui. Para conferir a lista de Janeiro Clique aqui.
Nota do Elaphar: 9,2
Edição Lida:
FITZGERALD, F. Scott. O Grande Gatsby. Tradução de Brenno Silveira. São Paulo: Abril Cultural, 1980.
sábado, 22 de janeiro de 2011
Vladmir Nabokov – Lolita
Prosseguindo os bônus do mês de Janeiro, apresento-lhes Lolita, que não é Infanto-Juvenil (por isso é um livro bônus, e não titular), mas aborda uma temática muito polêmica para a literatura da época: A sexualidade infantil.
Para quem não conhece, Nabokov é um escritor russo, que abandonou seu país em 1919. Nabokov escrevia principalmente romances e contos, mas também desenvolveu trabalhos de tradução, poesia e biografia. Embora escrevesse geralmente em russo, Lolita foi escrito em língua inglesa.
Acho difícil alguém nunca ter ouvido falar em Lolita, por vários fatores: 1º Existem vários filmes sobre o livro; 2º Popularizaram-se os termos “Lolita” e “ninfeta” na cultura popular, remetendo a questões sexuais; 3º Existe a “versão brasileira” dessa história (Presença de Anita); 4º Lolita é um dos maiores clássicos da literatura universal.
Lolita é um dos livros mais polêmicos da literatura, sendo que, em seu lançamento (primeiro na França e posteriormente nos Estados Unidos) uns o consideravam o melhor livro do ano e outros o definiam como pornografia absurda. Lolita conta a história de Humbert Humbert (mais de 40 anos) e Dolores Haze (13 anos). A narrativa é uma tensa história de obsessão e destruição, escrita com humor, ironia e densidade.
A narrativa começa com um monólogo sobre Lolita “Lolita, luz de minha vida, labareda em minha carne. Minha alma, minha lama” (p.11). O narrador encontra-se na cadeia, e o livro é a história/explicação do crime. Segundo o universo fictício, o personagem-narrador enviou o livro a um editor e morreu pouco tempo depois (embora provavelmente fosse condenado à cadeira elétrica). Após o monólogo de abertura, Humbert prossegue a narrativa explicando alguns pontos de sua vida, como sua infância comum e seu primeiro amor (Annabel), que segundo o narrador, pode ser a causa de seu problema.
Seguem-se a isso, algumas reflexões sobre as menininhas de poder nínfico, que o escritor batiza de “ninfetas” (para quem não sabe, Nabokov cunhou esse termo). Nesse momento percebemos de forma mais clara como Humbert é um maníaco de tendências pedófilas.
Depois disso, descobrimos mais algumas coisas sobre o senhor Humbert. Ele é um maníaco profissional, tendo freqüentado vários hospícios; faz de tudo para ficar próximo de menininhas; casa-se com uma neurótica (Valéria) e depois se separa. Acontecem algumas outras coisas pequenas, como um relacionamento com uma prostituta francesa (Monique) que provavelmente era menor de idade (embora tenha dito que possuía Dix-huit). Até essa parte, o livro possui um estilo proto-reflexivo e meio galhofeiro. Porém a escrita vai ficando mais tensa a partir do momento em que Humbert conhece a senhorita Haze e sua filha (Dolores, ou Lolita). Humbert se aproxima da menina e a senhorita Haze se apaixona por ele. A obsessão de Humbert é imensa, e ele escreve um minidiário.
Muita coisa aconteceu após (e vou tentar acelerar, pois essa resenha já está muito longa e eu ainda estou no início do livro), Haze manda a filha estudar em um colégio interno extremamente longe e manda uma carta de amor para o Sr Humbert, que o deixa frustrado, mas após pensar um pouco (com Lolita na cabeça), decide casar-se. Possui as esperanças de dopar a mãe e a filha e manter relações sexuais com Lolita, e ao recorrer aos dotes de sua mulher, imagina que é Lolita. Um detalhe importante: Haze mãe odeia Haze filha, o que Humbert percebe tardiamente, e a Sra. Haze decide mandar Lolita para mais longe ainda e permanentemente. Algumas passagens do texto durante esse período de casamento são curiosas também, como essa:
Humbert planeja então o assassinato de sua mulher, mas não consegue realizá-lo, pois ainda não é um assassino. Como o destino é uma coisa miserável, a Sra. Haze acha o diário de Humbert e fica horrorizada com o que lê, foge dele e acaba morrendo atropelada. Após o enterro, Humbert corre ao encontro de sua amada, tira-a do colégio sem informar a morte da mãe e ruma para um hospital inexistente, hospedando-se antes em um motel chamado “Caçadores Encantados”, onde pretende dopá-la.
Por azar (de Humbert), o remédio que levara era falso, e acabou não tendo sucesso em dopar Lolita, mas para sua sorte, a própria menina possui a iniciativa, e por questão de travessura resolve “brincar” com Humbert, o que aprendeu no acampamento. Vou omitir aqui alguns detalhes para não ser desagradável. Aí começa a viagem de ambos pelos quatro cantos dos EUA, e acaba a primeira parte do livro.
Na segunda parte, o romance muda completamente de direção, de estilo e de tom. A narração vai ficando cada vez mais melancólica e obsessiva. Muita coisa acontece nessa parte, mas não vou me ater à maior parte dos acontecimentos. Um ponto que pode vir a ser negativo na leitura (não para mim) é o excesso de frases em francês no livro, e essas frases são ainda mais frequentes na segunda parte.
Depois de muito viajar, Humbert decide parar e se estabelecer em um lugar fixo, e escolhe Beardsley. Matricula sua Lô em uma escola local (que possui uma filosofia educacional bizarra (p.180) e uma prática tradicional), e a única pessoa que possui contato regular com ambos é no profº Gaston. Nesse momento a obsessão atinge pontos mais críticos, e Dolores é privada de muitas coisas no ambiente escolar, incluindo a prática teatral, mas depois de uma conversa com a diretora, Humbert acaba permitindo o teatro.
Esse fragmento mostra um pouco da obsessão de Humbert. Nesse tempo há uma passagem interessante, que resolvi botar abaixo para dar uma descontraída antes de chegar às partes mais tensas da obra. De qualquer forma, é uma passagem importante (metafórica), embora isolada não pareça.
Como já está quase na hora do meu rango, vou acelerar mais um pouco a narrativa (evitando também tirar a graça da leitura). Lolita desiste da peça, e Humbert e Lolita fogem da cidade com medo de serem pegos, mas são perseguidos. Nesse momento, Dolores fica cada vez mais evasiva e estranha, enquanto Humbert cada vez mais neurótico. Lolita foge de Humbert com quem estava seguindo eles. (Acho que acelerei demais, mas já foi)
A narrativa entra em outro patamar: a perseguição. Humbert passa anos buscando Lolita sem a encontrar, e nesse meio tempo casa-se com Rita, uma mulher com o cérebro do tamanho de uma azeitona (segundo o próprio autor: “Comparadas a ela [Rita], Valechka era um Schlegel e Charlotte um Hegel” (p.262)). Rita sabe das intenções de Humbert e aprova-as. O “heroi” pega a arma do primeiro marido da Sra. Haze (pai de Lolita) e espera matar com ela o homem que tirou sua Lolita. Rita é uma personagem hilária e se mete em algumas confusões (como sugerir jogar roleta-russa com uma semi-automática, quase atirando em Humbert). Apesar de sua estupidez, Rita não é só hilária, como também é profunda e melancólica. Teve vários maridos e sempre foi abandonada, e sabe que será por Humbert, o que a deixa triste. Humbert encontra pistas de Lolita, abandonando Rita em seguida, e a encontra.
Humbert conversa com Lolita, e descobre que está casada e vivendo com outro jovem, que não mata porque não era o mesmo que roubou Lolita. Descobre o nome do seqüestrador (Quilty) e tenta, sem sucesso, convencer Dolores a voltar a viver como antigamente. Parte rumo à casa de Quilty, e assassina-o, não sem antes uma cena dramática. O livro termina com algumas reflexões do narrador.
Minha resenha pode ter parecido um pouco grande, mas não chega perto de mostrar os vários acontecimentos e características do livro. A obra em si é muito densa, rica e prazerosa de ler. Lolita não é só um clássico, mas um dos melhores livros que já li, embora tardiamente. Todas as bibliotecas de todas as casas deveriam possuir um exemplar de Lolita, e todas as pessoas deveriam ler esse livro. Essa é uma obra que provoca, incita, causa mal estar, mas da qual não conseguimos parar de ler. É uma pena não poder falar muito da tradução pois, minha preguiça intelectual não me permitiu ler o original inglês, entretanto, Jorio Dauster escreveu esse livro em um português excelente, o que me faz acreditar que é uma excelente tradução. Com louvor, ganha a nota mais alta que já dei nesse blog.
Esse livro é bônus do DL, e foi feito em decorrência do tema de Janeiro. Clique aqui para ver a página de Janeiro.
Nota do Elaphar: 10
Edição Lida:
NABOKOV, Vladmir. Lolita. Trad: Jorio Dauster. Rio de Janeiro: O Globo; São Paulo: Folha de São Paulo, 2003, 319p. (Biblioteca O GLOBO, Vol.1). © da tradução: Companhia das Letras.
Para quem não conhece, Nabokov é um escritor russo, que abandonou seu país em 1919. Nabokov escrevia principalmente romances e contos, mas também desenvolveu trabalhos de tradução, poesia e biografia. Embora escrevesse geralmente em russo, Lolita foi escrito em língua inglesa.
Acho difícil alguém nunca ter ouvido falar em Lolita, por vários fatores: 1º Existem vários filmes sobre o livro; 2º Popularizaram-se os termos “Lolita” e “ninfeta” na cultura popular, remetendo a questões sexuais; 3º Existe a “versão brasileira” dessa história (Presença de Anita); 4º Lolita é um dos maiores clássicos da literatura universal.
Lolita é um dos livros mais polêmicos da literatura, sendo que, em seu lançamento (primeiro na França e posteriormente nos Estados Unidos) uns o consideravam o melhor livro do ano e outros o definiam como pornografia absurda. Lolita conta a história de Humbert Humbert (mais de 40 anos) e Dolores Haze (13 anos). A narrativa é uma tensa história de obsessão e destruição, escrita com humor, ironia e densidade.
A narrativa começa com um monólogo sobre Lolita “Lolita, luz de minha vida, labareda em minha carne. Minha alma, minha lama” (p.11). O narrador encontra-se na cadeia, e o livro é a história/explicação do crime. Segundo o universo fictício, o personagem-narrador enviou o livro a um editor e morreu pouco tempo depois (embora provavelmente fosse condenado à cadeira elétrica). Após o monólogo de abertura, Humbert prossegue a narrativa explicando alguns pontos de sua vida, como sua infância comum e seu primeiro amor (Annabel), que segundo o narrador, pode ser a causa de seu problema.
Seguem-se a isso, algumas reflexões sobre as menininhas de poder nínfico, que o escritor batiza de “ninfetas” (para quem não sabe, Nabokov cunhou esse termo). Nesse momento percebemos de forma mais clara como Humbert é um maníaco de tendências pedófilas.
Quero agora expor uma idéia (sic). Entre os limites de idade de nove e catorze anos, virgens há que revelam a certos viajadores enfeitiçados, bastante mais velhos que elas, sua verdadeira natureza – que não é humana, mas nínfica (isto é, diabólica). A essas criaturas singulares proponho dar o nome de ‘ninfetas’. [...] Será que todas as meninas entre esse limite de idade são ninfetas? Claro que não. Se assim fosse, nós que conhecemos o mapa do tesouro, que somos os viajantes solitários, os ninfoleptos, teríamos há (sic) muito enlouquecido. Tampouco a beleza serve como critério; e a vulgaridade, ou pelo menos aquilo que determinados grupos sociais entendem como tal, não é necessariamente incompatível com certas características misteriosas, a graça natural, o charme imponderável, volúvel, insidioso e perturbador que distingue a ninfeta das meninas de sua idade [...] (p.18)
Quinta-feira. [...] Durante todo o tempo eu tinha a aguda consciência da proximidade de L. e, enquanto falava e gesticulava na misericordiosa obscuridade, valia-me daqueles gestos invisíveis para tocar sua mão, seu ombro e a pequena bailarina de lã e gaze que ela brincava e que, fazendo piruetas no ar, seguidamente aterrissava no meu colo; por fim, quando já tinha envolvido totalmente minha ardente amiguinha naquela teia de carícias etéreas, atrevi-me a roçar os dedos pela lanugem arrepiada de sua perna nua, e ri de minhas próprias piadas, e tremi, e ocultei meus tremores, e uma ou duas vezes meus lábios velozes puderam sentir o calor de seus cabelos [...] (p.47)Se você chegou até aqui, provavelmente está com os neurônios explodindo. Muitos pensamentos são incitados pelo narrador, e as descrições são riquíssimas e incômodas em algumas partes, e seus raciocínios sempre são muito racionais.
Muita coisa aconteceu após (e vou tentar acelerar, pois essa resenha já está muito longa e eu ainda estou no início do livro), Haze manda a filha estudar em um colégio interno extremamente longe e manda uma carta de amor para o Sr Humbert, que o deixa frustrado, mas após pensar um pouco (com Lolita na cabeça), decide casar-se. Possui as esperanças de dopar a mãe e a filha e manter relações sexuais com Lolita, e ao recorrer aos dotes de sua mulher, imagina que é Lolita. Um detalhe importante: Haze mãe odeia Haze filha, o que Humbert percebe tardiamente, e a Sra. Haze decide mandar Lolita para mais longe ainda e permanentemente. Algumas passagens do texto durante esse período de casamento são curiosas também, como essa:
A besteira [enquete de uma revista vagabunda] cobria vários anos e a mãezinha devia preencher um tipo de inventário a cada aniversário de seu rebento. No décimo segundo de Lô, no dia 1º de janeiro de 1947, Charlotte Haze, née Becker, havia sublinhado os seguintes dez adjetivos entre os quarenta disponíveis sob a rubrica ‘A personalidade de seu filho’: Agitada, agressiva, argumentadora, desatenta, desconfiada, impaciente, inquisitiva, irritadiça, negativista (sublinhado duas vezes) e teimosa. Havia ignorado os trinta outros adjetivos, dentre os quais constavam alegre, ativa, cooperativa e assim por diante. [...] Com uma brutalidade que, em outras ocasiões, nunca transparecia no temperamento suave de minha amorosa esposa, ela atacava e enxotava os pequenos pertences de Lô [...]. Mal sabia a boa senhora que certa manhã, [...] eu a traí com uma das soquetes de Lolita. (p.83)
Por azar (de Humbert), o remédio que levara era falso, e acabou não tendo sucesso em dopar Lolita, mas para sua sorte, a própria menina possui a iniciativa, e por questão de travessura resolve “brincar” com Humbert, o que aprendeu no acampamento. Vou omitir aqui alguns detalhes para não ser desagradável. Aí começa a viagem de ambos pelos quatro cantos dos EUA, e acaba a primeira parte do livro.
Na segunda parte, o romance muda completamente de direção, de estilo e de tom. A narração vai ficando cada vez mais melancólica e obsessiva. Muita coisa acontece nessa parte, mas não vou me ater à maior parte dos acontecimentos. Um ponto que pode vir a ser negativo na leitura (não para mim) é o excesso de frases em francês no livro, e essas frases são ainda mais frequentes na segunda parte.
Depois de muito viajar, Humbert decide parar e se estabelecer em um lugar fixo, e escolhe Beardsley. Matricula sua Lô em uma escola local (que possui uma filosofia educacional bizarra (p.180) e uma prática tradicional), e a única pessoa que possui contato regular com ambos é no profº Gaston. Nesse momento a obsessão atinge pontos mais críticos, e Dolores é privada de muitas coisas no ambiente escolar, incluindo a prática teatral, mas depois de uma conversa com a diretora, Humbert acaba permitindo o teatro.
‘[...] por que o senhor se opõe tão fortemente a que ela [Dolores] tenha todos os divertimentos naturais de uma menina normal.’
‘A senhora se refere a diversões sexuais?’, perguntei em tom jovial [...].
‘[...] Sob os auspícios da escola Beardsley, o teatro, as danças e outras atividades naturais não podem ser consideradas, do ponto de vista técnico, como diversões sexuais, embora as meninas se encontrem com meninos, se é a isso que o senhor objeta.’
‘Muito bem [...] A senhora ganhou. Ela pode participar de tal peça. Desde que os papéis masculinos sejam desempenhados por meninas.’ (p.199-200)
Como o leitor pode imaginar, naquela altura minhas faculdades se encontravam gravemente comprometidas e, um ou dois lances depois, quando era a vez de Gaston jogar, reparei, através do nevoeiro de minha angústia, que ele podia tomar minha rainha; ele reparou também, mas, pensando que podia se tratar de uma armadilha de seu ardiloso adversário, deteve-se por um bom minuto, bufando e resfolegando, e sacudiu as bochechas, e até me lançou alguns olhares furtivos, e mais uma vez avançou hesitantemente os dedos rechonchudos em forma de penca, recuando em seguida – doido para pegar aquela suculenta rainha e não ousando fazê-lo –, até que de repente arremeteu contra ela (quem sabe isso não o terá estimulado a cometer outras audácias posteriores?), e tive de gastar uma hora de esforços enfadonhos para conseguir um empate. Ele virou o resto do conhaque e finalmente saiu com aquele seu passo arrastado, muito satisfeito com o resultado (mon pauvre ami, je ne vous ai jamais revu et quoiqu’il y ait bien peu de chance que vous voyiez mon livre, permettez-moi de vous dire que jê vous serre la main bien cordialement, et que toutes mês fillettes vous saluent).
A narrativa entra em outro patamar: a perseguição. Humbert passa anos buscando Lolita sem a encontrar, e nesse meio tempo casa-se com Rita, uma mulher com o cérebro do tamanho de uma azeitona (segundo o próprio autor: “Comparadas a ela [Rita], Valechka era um Schlegel e Charlotte um Hegel” (p.262)). Rita sabe das intenções de Humbert e aprova-as. O “heroi” pega a arma do primeiro marido da Sra. Haze (pai de Lolita) e espera matar com ela o homem que tirou sua Lolita. Rita é uma personagem hilária e se mete em algumas confusões (como sugerir jogar roleta-russa com uma semi-automática, quase atirando em Humbert). Apesar de sua estupidez, Rita não é só hilária, como também é profunda e melancólica. Teve vários maridos e sempre foi abandonada, e sabe que será por Humbert, o que a deixa triste. Humbert encontra pistas de Lolita, abandonando Rita em seguida, e a encontra.
Humbert conversa com Lolita, e descobre que está casada e vivendo com outro jovem, que não mata porque não era o mesmo que roubou Lolita. Descobre o nome do seqüestrador (Quilty) e tenta, sem sucesso, convencer Dolores a voltar a viver como antigamente. Parte rumo à casa de Quilty, e assassina-o, não sem antes uma cena dramática. O livro termina com algumas reflexões do narrador.
Minha resenha pode ter parecido um pouco grande, mas não chega perto de mostrar os vários acontecimentos e características do livro. A obra em si é muito densa, rica e prazerosa de ler. Lolita não é só um clássico, mas um dos melhores livros que já li, embora tardiamente. Todas as bibliotecas de todas as casas deveriam possuir um exemplar de Lolita, e todas as pessoas deveriam ler esse livro. Essa é uma obra que provoca, incita, causa mal estar, mas da qual não conseguimos parar de ler. É uma pena não poder falar muito da tradução pois, minha preguiça intelectual não me permitiu ler o original inglês, entretanto, Jorio Dauster escreveu esse livro em um português excelente, o que me faz acreditar que é uma excelente tradução. Com louvor, ganha a nota mais alta que já dei nesse blog.
Esse livro é bônus do DL, e foi feito em decorrência do tema de Janeiro. Clique aqui para ver a página de Janeiro.
Nota do Elaphar: 10
Edição Lida:
NABOKOV, Vladmir. Lolita. Trad: Jorio Dauster. Rio de Janeiro: O Globo; São Paulo: Folha de São Paulo, 2003, 319p. (Biblioteca O GLOBO, Vol.1). © da tradução: Companhia das Letras.
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Stephen King - Carrie, A Estranha
Stephen King é talvez o mais bem sucedido escritor vivo, possuindo uma grande recepção de leitores (leia-se "vendas") e uma boa crítica (entre leitores, jornais e até na academia). Ironicamente, nunca havia lido um único livro dele, e "Carrie, A Estranha" foi o primeiro (lido pouco depois do dia das bruxas), e agora vou comentar essa experiência. Para quem é alienado não conhece, Stephen King é o criador de livros e contos adaptados para o cinema como: A Espera de Um Milagre, Vôo Noturno, A Colheita Maldita, 1408, e Carrie, a Estranha, sendo que a "Colheita" e "Carrie" tiveram remakes. Além das obras adaptadas, Stephen escreveu o famigerado "O Iluminado" e a saga de sete volumes "A Torre Negra". Você pode não ter lido nenhuma dessas obras (como eu), mas não conhecê-las (ao menos uma delas) é bem difícil.
Vou ser sincero com todos vocês, decidi ler Stephen King após sua declaração dizendo o seguinte:
Agora, falando sobre o livro, a própria capa já chama atenção, sendo uma excelente capa. O título da obra (Carrie, a Estranha) é tradução do original que chama-se Carrie... ... ... O que me deixa a pergunta de: QUEM FOI O IMBECIL QUE COLOCOU O "A ESTRANHA" NO TÍTULO??? É verdade que é uma mania dos tradutores dar o seu "toque pessoal", mas não acho que o título deveria ser alterado dessa forma... Pelo menos é melhor do que o que fizeram com "Memórias Póstumas" em língua inglesa (Epitaph of a Small Winner) ou o que fizeram com "Nights in Rodanthe" em língua alemã (Das Lächeln der Sterne). Creio que esse "a Estranha" está aí por conta do filme (que foi publicado primeiro no Brasil), e é extremamente natural essas mudanças grotescas ou acréscimos de "subtítulos" nas traduções dos títulos. Claro, que após ler a ficha catalográfica e conferir a diferença do título, minha animação quanto ao livro ficou bem fraca, mas posso dizer que me surpreendi.
O primeiro ponto positivo no livro, é o seu nível de realidade. Quem já leu o livro pode ficar perguntando: Que diabos uma história sobre poderes telecinéticos pode ter de real??? A resposta é simples... uma menina criada sob preceitos religiosos extremos acaba dizendo para sua mãe: "Sua FODIDA"!!! Isso mesmo, uma menina de 17 anos usa linguagem de estivador... Não venham bancar os puritanos, todo mundo sabe que essas palavras são usadas pelas pessoas em idade escolar, e até mesmo a melhor garota da escola (Susan) usa palavras do tipo. E a moral é bem presente no livro, pois o pai de Cris ameaça entrar em um processo contra a professora pois ela usou a palavra "escroto", como se as meninas (e principalmente a filha dele) não conhecesse a palavra. E além disso ainda tem o Bullying contra a Carrie, que é recorrente durante toda a obra. Esse fidelidade no português indica (mas não afirma, pois não li o original, e nem pretendo ler) que é uma boa tradução, apesar do título; claro, que há a pequena gafe de traduzir o nome da música "Pomp And Circumstance" de Elgar (popularmente conhecida como: Música de Formatura), pois, os brasileiros que conhecem essa música pelo nome, em geral, conhecem em inglês mesmo, além do fato de que NOMES NÃO SE TRADUZEM.
Outro ponto que eu achei muito interessante e criativo, foi cruzar a narrativa com fragmentos de supostos livros e documentos sobre o caso "Carrie White", sendo que as informações divergem entre os documentos e a narrativa.
Agora, quanto a história...
A narrativa é longa e lenta, porém interessante, com suas idas e vindas e seus trechos de documentos, livros, pichações e até mesmo folhas de cadernos. Os pensamentos das personagens são "jogados" no meio dos parágrafos, e o desfecho trágico, embora sempre previsível (já que nas primeiras páginas já se cita a tragédia envolvendo o TC de Carrie), surpreende por alguns fatores e ainda assim mantém todo o seu drama. Muito bom também é a terceira (e última) parte do livro, intitulada "Escombros", onde apenas os documentos e livros falam (não mais a narrativa tradicional) e mostram o pós "Dia do Baile", e as marcas permanentes em todos, que fazem a cidade parecer uma grande necrópole de vivos.
Concluindo, considero o livro (e a tradução de Adalgisa Campos da Silva) de boa qualidade (apesar da tradução do título), assim como a qualidade editorial da Objetiva (com o selo Ponto de Leitura), e acho que quem não ainda não leu esse livro, está perdendo uma literatura de qualidade.
Nota do Elaphar: 9,1
Edição Lida:
King, Stephen. Carrie, a estranha. Trad: Adalgisa Campos da Silva. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009. (Selo Ponto de Leitura)
Vou ser sincero com todos vocês, decidi ler Stephen King após sua declaração dizendo o seguinte:
<<The real difference is that Jo Rowling is a terrific writer and Stephenie Meyer can't write worth a darn. She's not very good>>Não concordando nem discordando de Stephen, mas admito que gosto das brigas entre escritores, sendo que Nietzsche já atacou George Sand, Machado de Assis já atacou Eça de Queirós (e Vargas Llosa literalmente atacou Garcia Marquez (com um soco na cara mais precisamente)). Acho que isso é produtivo para a literatura. Ou não.
Agora, falando sobre o livro, a própria capa já chama atenção, sendo uma excelente capa. O título da obra (Carrie, a Estranha) é tradução do original que chama-se Carrie... ... ... O que me deixa a pergunta de: QUEM FOI O IMBECIL QUE COLOCOU O "A ESTRANHA" NO TÍTULO??? É verdade que é uma mania dos tradutores dar o seu "toque pessoal", mas não acho que o título deveria ser alterado dessa forma... Pelo menos é melhor do que o que fizeram com "Memórias Póstumas" em língua inglesa (Epitaph of a Small Winner) ou o que fizeram com "Nights in Rodanthe" em língua alemã (Das Lächeln der Sterne). Creio que esse "a Estranha" está aí por conta do filme (que foi publicado primeiro no Brasil), e é extremamente natural essas mudanças grotescas ou acréscimos de "subtítulos" nas traduções dos títulos. Claro, que após ler a ficha catalográfica e conferir a diferença do título, minha animação quanto ao livro ficou bem fraca, mas posso dizer que me surpreendi.
O primeiro ponto positivo no livro, é o seu nível de realidade. Quem já leu o livro pode ficar perguntando: Que diabos uma história sobre poderes telecinéticos pode ter de real??? A resposta é simples... uma menina criada sob preceitos religiosos extremos acaba dizendo para sua mãe: "Sua FODIDA"!!! Isso mesmo, uma menina de 17 anos usa linguagem de estivador... Não venham bancar os puritanos, todo mundo sabe que essas palavras são usadas pelas pessoas em idade escolar, e até mesmo a melhor garota da escola (Susan) usa palavras do tipo. E a moral é bem presente no livro, pois o pai de Cris ameaça entrar em um processo contra a professora pois ela usou a palavra "escroto", como se as meninas (e principalmente a filha dele) não conhecesse a palavra. E além disso ainda tem o Bullying contra a Carrie, que é recorrente durante toda a obra. Esse fidelidade no português indica (mas não afirma, pois não li o original, e nem pretendo ler) que é uma boa tradução, apesar do título; claro, que há a pequena gafe de traduzir o nome da música "Pomp And Circumstance" de Elgar (popularmente conhecida como: Música de Formatura), pois, os brasileiros que conhecem essa música pelo nome, em geral, conhecem em inglês mesmo, além do fato de que NOMES NÃO SE TRADUZEM.
Outro ponto que eu achei muito interessante e criativo, foi cruzar a narrativa com fragmentos de supostos livros e documentos sobre o caso "Carrie White", sendo que as informações divergem entre os documentos e a narrativa.
Agora, quanto a história...
Alerta!!! Esse texto pode conter spoilers como o fato de que Carrie destrói a cidade e mata todos os que a humilhavam ou que os sobreviventes decidem abandonar a cidade. Agora que você já sabe disso, pode continuar lendo o texto sem preocupações.Uma história que extasia e assusta, essa é a melhor descrição possível para essa história, que sabiamente está presente na 4ª capa (não com essas palavras). Muitos pontos desse livro são sinistros, como o fanatismo religioso da Sra. White, e seu Deus vingativo e destruidor, suas crenças e o sangue de Jesus escorrendo do crucifixo no centro da casa. O comportamento animal (e real) dos seres humanos também pode assustar, mas não mais que os poderes e pensamentos de Carrie, que com sua confusão podem varrer sua pobre cidade do mapa, o que de fato fez.
A narrativa é longa e lenta, porém interessante, com suas idas e vindas e seus trechos de documentos, livros, pichações e até mesmo folhas de cadernos. Os pensamentos das personagens são "jogados" no meio dos parágrafos, e o desfecho trágico, embora sempre previsível (já que nas primeiras páginas já se cita a tragédia envolvendo o TC de Carrie), surpreende por alguns fatores e ainda assim mantém todo o seu drama. Muito bom também é a terceira (e última) parte do livro, intitulada "Escombros", onde apenas os documentos e livros falam (não mais a narrativa tradicional) e mostram o pós "Dia do Baile", e as marcas permanentes em todos, que fazem a cidade parecer uma grande necrópole de vivos.
Concluindo, considero o livro (e a tradução de Adalgisa Campos da Silva) de boa qualidade (apesar da tradução do título), assim como a qualidade editorial da Objetiva (com o selo Ponto de Leitura), e acho que quem não ainda não leu esse livro, está perdendo uma literatura de qualidade.
Nota do Elaphar: 9,1
Edição Lida:
King, Stephen. Carrie, a estranha. Trad: Adalgisa Campos da Silva. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009. (Selo Ponto de Leitura)
sábado, 30 de outubro de 2010
H.P. Lovecraft - A Tumba e Outras Histórias
O dia das bruxas (Halloween) está chegando, e nada melhor nesse dia que ler um livro. Eis que apresento "A Tumba" de Howard Phillips Lovecraft.
Para quem não conhece, H.P. Lovecraft é quase um "Deus" dos contos de terror, foi influenciado por Poe, passou a ser influência básica de todos os escritores que seguem essa linha, como por exemplo Stephen King e Borges. Além da literatura, Lovecraft influenciou muito o cinema e música, essa última, bandas como Black Sabbath, Iron Maiden, Metallica (The Call of Ktulhu e All Nightmare Long) e Adagio (R'lyeh the Dead). Pessoalmente, conheci Lovecraft no RPG, na época em que jogava The Call of Cthulhu.
Não é a toa todo esse nome na literatura de horror, pois, ao ler "A Tumba e Outras Histórias" sentimos um clima denso e sinistro a partir da leitura.Muito bom livros da época em que monstros eram monstros, e vampiros não brilhavam no sol.
O primeiro conto, que dá nome ao livro, é denso e carregado de loucura (característica importante da obra lovecraftiana) e mistério. A narração em primeira pessoa é extremamente perturbadora, pois, o narrador está internado em uma clínica psiquiátrica e não há garantias da completa destruição de sua sanidade mental. Mesmo se o relato do narrador for verídico (o que é possível na narrativa), o que presenciou é o suficiente para transformar seu cérebro em massa gelatinosa.
O segundo conto, também narrado em primeira pessoa, chama-se "O Festival". Nesse conto, percebe-se muitas características de Poe (principalmente em "The Raven"), desde o clima sombrio, ao excesso de adjetivos, até os "tomos de ciências ancestrais". A sabedoria e a tradição são as mais sinistras possíveis nesse conto, e as descrições dos ambientes e das criaturas são muito fortes.
Já o 3º conto (Aprisionado Com os Faraós), há uma nítida divisão em duas partes. A primeira, é alegre, apresentativa (existe isso?) e uma grande aula sobre o Egito (sejam verdadeiros os fatos ou não), assim como a primeira metade do livro Mobby Dick (que possui uma verdadeira aula sobre baleias). Essa primeira parte, é bastante longa, mas ainda assim interessante. Quando a segunda parte começa, começa o incrível, o onírico e a loucura.
Em "Ele", o quarto conto do livro, há um jogo interessante com o tempo e as artes secretas. O quarto conto por sua vez, chama-se "Horror em Red Hook", e é um conto policial (em terceira pessoa), onde a investigação se mistura a forças demoníacas, entidades secretas, mistérios insolúveis, barbaridades e é claro, a loucura. Em Red Hook o mal está além do que pode ser eliminado, e está enraizado na terra.
"A Estranha Casa que Pairava na Névoa" é um grande conto, que, embora não tenha o horror presente nos contos anteriores, possui um jogo com o incrível, assim como o próximo conto (Entre as Paredes de Eryx), que também não é de terror, mas espacial. A narrativa de ficção científica não é o "Forte" de Lovecraft, entretanto, esse conto é muito instigante e reflexivo. Há muito o que pensar em "Entre as Paredes de Eryx", mas acima de qualquer coisa, é um conto divertido e bom de se ler. O último conto por fim, que chama-se "O Clérigo Diabólico", é misterioso e sinistro.
Além desses contos, "A Tumba e Outras Histórias" conta com mais cinco contos ditos "imaturos" de Lovecraft e mais quatro fragmentos (ou contos incompletos). Dentre os primeiros contos (os "imaturos"), alguns surpreendem, sendo que o conto "A Fera na Caverna" pode ser considerado até como o melhor conto do livro, enquanto "Poesia e os Deuses" é extremamente moderno e inovador, com um jogo de misturas e reflexões sobre a arte de escrever. O conto "A Rua" me lembra muito "Ícaro, Icarus" do escritor brasileiro Alfredo Garcia, até mesmo em sua estrutura, o que me faz pensar se Alfredo também não é um influenciado de Lovecraft (o que é estranho, levando em consideração que o escritor brasileiro escreve muito infanto-juvenil, mas acho que estou divagando). Não quero comentar sobre os fragmentos, pois são incompletos, embora alguns mereçam comentários longos.
A obra de Lovecraft é vasta e interessante (e em parte assustadora), e a tradução de Jorge Ritter é de grande qualidade (independente do original, pois, minha preguiça me impediu de ler os textos originais), e a única crítica possível seria quanto às poesias, que foram traduzidas apenas em seu sentido e não em sonoridade (metro e rima), como pode ser observado na tradução de: "Pile each on your platter a mountain of beef,/ For'tis eating and drinking that brings us relief;" para: "Abarrotem suas travessas com uma montanha de carne/ Pois comer e beber é o que nos traz alívio", mas não acho que esse ritmo de prosa seja prejudicial à leitura, e além do mais, o original aparece em nota de rodapé.
Por fim, a qualidade da edição é muito boa (marca da L&PM, que cada vez sobe mais no meu conceito), o que pode ser visto desde a capa que possui o clima sombrio que o livro merece, mostrando que os livros de bolso podem sim ter qualidade a preços baixos. Só achei que faltou pelo menos um conto da parte Chthuliana da obra de Lovecraft, mas há também "O Caso de Charles Dexter Ward" que também foi publicado pela mesma editora.
Como Lovecraft pertence ao domínio público, sua obra está disponível aqui (em inglês) e aqui (em português).
Nota do Elaphar: 9,0
Edição Lida:
LOVECRAFT, H.P. A Tumba e Outras Histórias. Trad: Jorge Ritter. Porto Alegre: L&PM, 2010, 224p. (Coleção L&PM Pocket)
Como falei hoje da L&PM que subiu no meu conceito, outra hora falo de uma editora que caiu em conceito.
Para quem não conhece, H.P. Lovecraft é quase um "Deus" dos contos de terror, foi influenciado por Poe, passou a ser influência básica de todos os escritores que seguem essa linha, como por exemplo Stephen King e Borges. Além da literatura, Lovecraft influenciou muito o cinema e música, essa última, bandas como Black Sabbath, Iron Maiden, Metallica (The Call of Ktulhu e All Nightmare Long) e Adagio (R'lyeh the Dead). Pessoalmente, conheci Lovecraft no RPG, na época em que jogava The Call of Cthulhu.
Não é a toa todo esse nome na literatura de horror, pois, ao ler "A Tumba e Outras Histórias" sentimos um clima denso e sinistro a partir da leitura.
O primeiro conto, que dá nome ao livro, é denso e carregado de loucura (característica importante da obra lovecraftiana) e mistério. A narração em primeira pessoa é extremamente perturbadora, pois, o narrador está internado em uma clínica psiquiátrica e não há garantias da completa destruição de sua sanidade mental. Mesmo se o relato do narrador for verídico (o que é possível na narrativa), o que presenciou é o suficiente para transformar seu cérebro em massa gelatinosa.
O segundo conto, também narrado em primeira pessoa, chama-se "O Festival". Nesse conto, percebe-se muitas características de Poe (principalmente em "The Raven"), desde o clima sombrio, ao excesso de adjetivos, até os "tomos de ciências ancestrais". A sabedoria e a tradição são as mais sinistras possíveis nesse conto, e as descrições dos ambientes e das criaturas são muito fortes.
Já o 3º conto (Aprisionado Com os Faraós), há uma nítida divisão em duas partes. A primeira, é alegre, apresentativa (existe isso?) e uma grande aula sobre o Egito (sejam verdadeiros os fatos ou não), assim como a primeira metade do livro Mobby Dick (que possui uma verdadeira aula sobre baleias). Essa primeira parte, é bastante longa, mas ainda assim interessante. Quando a segunda parte começa, começa o incrível, o onírico e a loucura.
Em "Ele", o quarto conto do livro, há um jogo interessante com o tempo e as artes secretas. O quarto conto por sua vez, chama-se "Horror em Red Hook", e é um conto policial (em terceira pessoa), onde a investigação se mistura a forças demoníacas, entidades secretas, mistérios insolúveis, barbaridades e é claro, a loucura. Em Red Hook o mal está além do que pode ser eliminado, e está enraizado na terra.
"A Estranha Casa que Pairava na Névoa" é um grande conto, que, embora não tenha o horror presente nos contos anteriores, possui um jogo com o incrível, assim como o próximo conto (Entre as Paredes de Eryx), que também não é de terror, mas espacial. A narrativa de ficção científica não é o "Forte" de Lovecraft, entretanto, esse conto é muito instigante e reflexivo. Há muito o que pensar em "Entre as Paredes de Eryx", mas acima de qualquer coisa, é um conto divertido e bom de se ler. O último conto por fim, que chama-se "O Clérigo Diabólico", é misterioso e sinistro.
Além desses contos, "A Tumba e Outras Histórias" conta com mais cinco contos ditos "imaturos" de Lovecraft e mais quatro fragmentos (ou contos incompletos). Dentre os primeiros contos (os "imaturos"), alguns surpreendem, sendo que o conto "A Fera na Caverna" pode ser considerado até como o melhor conto do livro, enquanto "Poesia e os Deuses" é extremamente moderno e inovador, com um jogo de misturas e reflexões sobre a arte de escrever. O conto "A Rua" me lembra muito "Ícaro, Icarus" do escritor brasileiro Alfredo Garcia, até mesmo em sua estrutura, o que me faz pensar se Alfredo também não é um influenciado de Lovecraft (o que é estranho, levando em consideração que o escritor brasileiro escreve muito infanto-juvenil, mas acho que estou divagando). Não quero comentar sobre os fragmentos, pois são incompletos, embora alguns mereçam comentários longos.
A obra de Lovecraft é vasta e interessante (e em parte assustadora), e a tradução de Jorge Ritter é de grande qualidade (independente do original, pois, minha preguiça me impediu de ler os textos originais), e a única crítica possível seria quanto às poesias, que foram traduzidas apenas em seu sentido e não em sonoridade (metro e rima), como pode ser observado na tradução de: "Pile each on your platter a mountain of beef,/ For'tis eating and drinking that brings us relief;" para: "Abarrotem suas travessas com uma montanha de carne/ Pois comer e beber é o que nos traz alívio", mas não acho que esse ritmo de prosa seja prejudicial à leitura, e além do mais, o original aparece em nota de rodapé.
Por fim, a qualidade da edição é muito boa (marca da L&PM, que cada vez sobe mais no meu conceito), o que pode ser visto desde a capa que possui o clima sombrio que o livro merece, mostrando que os livros de bolso podem sim ter qualidade a preços baixos. Só achei que faltou pelo menos um conto da parte Chthuliana da obra de Lovecraft, mas há também "O Caso de Charles Dexter Ward" que também foi publicado pela mesma editora.
Como Lovecraft pertence ao domínio público, sua obra está disponível aqui (em inglês) e aqui (em português).
Nota do Elaphar: 9,0
Edição Lida:
LOVECRAFT, H.P. A Tumba e Outras Histórias. Trad: Jorge Ritter. Porto Alegre: L&PM, 2010, 224p. (Coleção L&PM Pocket)
Como falei hoje da L&PM que subiu no meu conceito, outra hora falo de uma editora que caiu em conceito.
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