segunda-feira, 7 de março de 2011

O Anel dos Nibelungos (Das Rheingold) - Richard Wagner

"Deutschland, Deutschland über alles" (Primeiro verso do Deutschlandlied)!!! Não falei que esse mês seria alemão? E agora resenharei algumas das mais importantes obras poéticas, dramáticas e musicais da Alemanha, que são as 4 óperas do cíclo O Anel dos Nibelungos (Der Ring des Nibelungen), iniciando com o Das Rheingold (O Ouro do Reno), ópera introdutória em um único ato.

Richard Wagner é uma das figuras mais importantes do mundo da arte. Foi o primeiro "estudioso" da obra de Schopenhauer, e, na finalidade de criar a obra de arte suprema, criou uma música dramática e uma literatura musical. Sua biografia é um capítulo a parte: era anti-semita em igual nível que amigo de judeus influentes; criou uma monumental casa de ópera em Bayreuth chamada Bayreuth Festspielhaus; foi exilado; foi amigo de Nietzsche e posteriormente inimigo ferrenho deste. Muitos o consideram um ser humano despresível, entretanto, após Wagner não foi mais possível fazer música ou literatura como se Wagner não existisse. Bem ou mal, ou consideram a obra wagneriana como a coisa mais genial do mundo, ou como a mais abusiva. 8 ou 80.

A história do Anel dos Nibelungos precede Wagner, e é a história mais influente de toda a cultura Nórdica ou Teutônica. A lenda do anel conta a história de Sigurd (para os Nórdicos) ou Siegfried (para os Teutônicos). Essa lenda faz parte da cultura religiosa destes povos, e é representada por escrito em diversos manuscritos medievais, dentre eles as Pedras Rúnicas da Suécia, o Livro de Edda da Islândia e o Nibelungenlied da Alemanha. A presença da lenda na cultura popular e erudita é absurda, possuindo óperas (estas e uma outra chamada Sigurd), filmes, livros, poesias, entre outras influências, como em O Senhor dos Aneis, Cavaleiros do Zodíaco (há um personagem chamado Siegfried) e Walkyrie Profile (há o Anel dos Nibelungos no jogo). A versão wagneriana da lenda é uma obra tão singular (até mesmo em comparação com as outras versões da história) que é um original por si só. As modificações no mundo da música são muitas, desde a criação do leitmotiv, da unidade do texto (não mais divididos em recitais, árias, duetos e etc...), a massificação orquestral, o supervirtuosismo vocal entre outras, o que rendeu à essa ópera a alcunha de "absurdamente exagerada" (principalmente à segunda).

Literariamente (o que nos interessa mais nesse blog), Wagner começa sua ópera no roubo do ouro do reno pelo nibelungo Alberich, ouro esse que se dele for forjado um anel, o portador será dono do mundo (lembra o Um Anel não?). O ciclo fecha-se com a morte de Siegfried (que só aparece da terceira ópera até a quarta), diferente do Nibelungenlied, que inicia-se com Siegfried em seu melhor estado e termina muito depois de sua morte. O Das Rheingold encerra-se quando Fafner mata seu irmão e pega o anel. Das Rheingold é uma peça introdutória, que explica os acontecimentos anteriores os da narrativa em si, que têm como protagonistas Siegmund, Brünnhild e Siegfried. Os principais personagens de Das Rheingold são os deuses Wotan e Loge, o nibelungo Alberich e o gigante Fafner (posteriormente dragão).

Das Rheingold começa com um lento prelúdio representando o movimento do reno. Não é o melhor prelúdio de Wagner, mas não chega a ser ruim. Em seguida aparece a cena das ninfas brincando, chega Alberich, que dá em cima das ninfas. Elas ignoram o nibelungo feio, que fica com raiva, renega o amor e rouba o ouro do reno. Não há nada de muito especial nesta cena. A música é legal, mas não há toda a emoção vocal, e a cantada de Alberich é extremamente sem graça. O melhor Alberich (se vos interessar) na minha opinião é Neidlinger, que aparece na versão de Solti (regente). Lastimavelmente, o Alberich de Karajan (Kelemen) não é o forte dessa gravação, mas, ainda prefiro a gravação de Karajan sobre qualquer outra, e a justificativa vem a partir da segunda cena.

Segunda cena: uma Ochesterzwischenspiel bela, e em seguida aparece Wotan, o deus dos deuses, dormindo. Fricka surge e acorda-o. Essa cena tem uma expressividade dificilmente vista em qualquer outra obra teatral. Os gigantes estão construindo o palácio de Wotan, que como pagamento, cederá Freia para os gigantes que construiram o castelo (Fafner e Fasolt, este ultimo, apaixonado pela deusa). Wotan planeja enganar os gigantes com a ajuda de Loge. Entretanto, o plano não sai como deveria. Os gigantes tentam pegar Freia a força e quase se envolvem em uma briga pesada com os irmãos da moça (Donner e Froh). Loge aparece e hipocritamente afirma que não prometeu salvar Wotan desse impasse, mas sim PROCURAR um modo para isso, o que disse que não conseguiu (Mit höchster Sorge/rauf zu sinnen,/wie es zu lösen,/das - hab ich gelobt./Doch daß ich fände,/was nie sich fügt,/was nie gelingt,/wie ließ’ sich das wohl geloben?). Loge estava com a intenção de enganar os deuses, e ele, como semideus, não necessita da fruta dos deuses que apenas Freia pode colher. Loge passa a perna em todos, brilhantemente. Segue-se então uma eloquente discussão, e Wotan deve cumprir sua palavra. Nesta cena segue também a melhor parte (musicalmente falando) de toda a obra, que é o monólogo de Loge intitulado Immer ist Undank Loges Lohn! (A ingratidão sempre é a recompensa de Loge). Esse monólogo é irônico, mal intensionado, longo e profundo. O melhor Loge é, sem dúvida nenhuma, o de Karajan. A voz que Karajan encontra para Loge combina perfeitamente com o papel, e é de uma hipocrisia e ironia impressionante. Depois do Loge de Karajan, Erin Caves é a minha segunda performance favorita, embora não tenha a ambiguidade e expressividade sínica do outro Loge, sua voz é muito mais bela e poderosa, e sua interpretação de palco não deixa a desejar.



Depois desse monólogo, Fafner decide substituir o pagamento (Freia) por outro (o anel roubado por Alberich), levando Freia como garantia. Sem opção, Wotan decide pegar o anel e dar para os gigantes, e deve fazer o quanto antes, pois sem Freia a vida dos deuses vai ser muito difícil.

Chega a terceira cena. Alberich escravisou os outros nibelungos, inclusive seu irmão Mime (será uma figura importante em breve). Alberich está de posse de um elmo que lhe deixa invisível (lembra o Um Anel não?) e lhe permite transformar-se em outra coisa, com a finalidade de "vigiar sem ser vigiado" (preciso falar mais algo?). Orquestralmente, a terceira cena é demais. A história se passa dos deuses Wotan e Loge enganando, capturando e tomando o Anel de Alberich. Algumas partes são brilhantes como a da entrada dos deuses. A tomada do anel e a longa maldição de Alberich (antes de ser libertado) também é genial, musical, teatral e literariamente.O monólogo de Alberich (Die in linder Lüfte Wehn) pode ser baixado clicando aqui.

A terceira cena também é bem dramática. Wotan se recusa a dar o anel, mas entrega, e há uma briga entre os gigantes, onde Fafner mata seu irmão. Percebe-se aí a influência da maldição rogada por Alberich, que permeará toda a obra, tendo o seu ápice em Götterdämmerung.

O mito do Anel dos Nibelungos possui uma grande importância e influência em toda a cultura alemã e é muito forte na cultura ocidental geral. Wagner dá uma nova visão desse mito, e possui uma beleza singular. Em Das Rheingold ainda não aparecem as grandes modificações que virão surgir na versão wagneriana do mito, mas é muito importante de ser ouvido, assistido e/ou lido, pois introduz uma série de coisas importantes para a obra em geral, como a maldição de Alberich, a presença de Mime e a própria história e poder do anel do ouro do Reno. Por ser uma resenha especial, não haverá nota nem edição lida.

Esse livro é bônus do DL, e foi feito em decorrência do tema de Março. Clique aqui para ver a página de Março.

3 comentários:

  1. eu nem acabei de ler o meu primeiro e você já está no bônus, UAUUUUU...invejinha boa!!

    bjs

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  2. Báh Raphael, é como te disse no outro comentário, cada vez que venho aqui é um alargamento do meus horizontes literários sem precedentes, é impressionante como consegues escrever de forma tão fluida sobre uma obra grandiosa. Não conhecia esta obra e fiquei muito feliz em conhecer através do teu texto, mais um vez parabéns!

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  3. Adorei a maneira primaz com que tratas esta obra de Wagner. Forte abraço!

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