Me propus realizar a homérica missão de resenhar todo o ciclo do Anel dos Nibelungos de Richard Wagner, e já estou no 3º, a ópera Siegfried. A obra está sob a forma de Libretto, que em italiano quer dizer brochura (que segundo a ABNT, se aplica às publicações com menos de 60 páginas, desconsiderando capas), mas, apesar do pequeno tamanho, a obra está em verso e possui uma riquesa lírico-narrativa impressionante. É em Siegfried que aparece um dos personagens mais representativos da mitologia teutônica, que está massificadamente presente na cultura popular, e que é o herói principal da série. O Siegfried de Wagner, diferente de outras versões, é filho de Siegmund com sua irmã (os dois são volsungas, ou Wälsung, tanto faz), o que faz de Siegfried neto de Wotan duas vezes (por parte de pai e de mãe). Entre Die Walkürie e Siegfried, Sieglinde vai até próximo da caverna de Fafner e encontra o nibelungo Mime (irmão de Alberich), que cria Siegfried até seu crescimento. Se vocês já assistiram o filme O Anel dos Nibelungos, esqueça-o, pois, Mime (pai adotivo de Siegfried) não é bom. Deseja que Siegfried pegue o anel e planeja matá-lo. Mas, vamos para a história.
Primeira cena do primeiro ato. Mime está com raiva pois está preparando uma espada para Siegfried, mas sabe que o jovem quebrará a arma assim que estiver pronta. O nibelungo sonha obter o Anel e o Tarnhelm (helmo que transforma), e para isso precisa de Siegfried. O jovem chega com um URSO encoleirado, e brinca com o urso como se este fosse um Poodle. Depois ele quebra a espada pronta como se fosse uma vareta de bambu, o que deixa Mime puto de raiva. Mime conta a história de Siegfried (pois o jovem o ameaçou), mas sem lhe contar a história do pai. Mime mostra os fragmentos da escali... ops, digo Notung e Siegfried fica animado, pedindo para que Mime reconstrua a espada.
Duas coisas podemos perceber a partir da leitura e audição da primeira cena. A primeira é que Siegfried não é tão monumental (músicalmente) quanto Die Walkürie, e que a dramatização é mais importante do que as narrativas e lirismo. É a obra mais dramática das quatro óperas, e ao mesmo tempo a mais épica. A segunda é que Siegfried é o heroi com mais testosterona da história da literatura (mais até do que Lance e Bill [Contra]). Não é qualquer um que brinca com um ursinho de estimação e quebra uma espada de metal feita por um nibelungo como se fosse de plástico... e olha que só estamos começando. Siegfried poderia ser até capa dos CDs do Manowar.
Na segunda cena, Wotan aparece e provoca Mime, dizendo ao final que apenas quem não conhece o medo poderá forjar a espada Notung (,,Nur wer das Fürchten/nie erfuhr,/schmiedet Notung neu.”), e assim passa para a 3ª cena, onde entra Siegfried e pede a espada, que Mime não conseguiu forjar. Como Siegfried não conhece o medo, ele mesmo forja a espada e para testá-la parte uma bigorna meio (Gott!!! Quanta testosterona!!!).
No segundo ato, Alberich espreita Fafner (agora transformado em dragão), quando surge Wotan e avisa a Fafner que vem alguem matá-lo. Fafner não se importa e na segunda cena Siegfried aparece e mata o dragão, que conta sua história. Após matar o dragão, Siegfried bebe o seu sangue e ganha o poder clarividente de falar com as aves (mais uma diferença da versão wagneriana e do Nibelungenlied). Siegfried então descobre o que Mime planejava e mata-o, conversando em seguida com uma ave que lhe fala sobre Brünnhilde. Siegfried se prepara para mais uma prova de bravura.
Na primeira cena do último ato, Wotan invoca a deusa da Terra (novamente aconselho a gravação do Karajan, pois, que voz para Erda...) e conversa com ela. Esse diálogo é muito legal de se ler, mas ele não cria mudanças significativas no enredo. Está aqui como dica. Em seguida (Segunda Cena), Siegfried encontra Wotan (que não saiu do lugar), e há uma discussão entre eles. Wotan afirma que já quebrou a Notung uma vez e pode fazê-lo novamente (Das Schwert, das du schwingst,/erschlug einst dieser Schaft:/noch einmal denn/zerspring es am ew’gen Speer!), mas Siegfried quebra a lança e Wotan recolhe os pedaços tranquilamente e desaparece. Os diálogos desta cena são bons, mas não gosto muito desse final...
E por fim, Siegfried encontra Brünnhilde, e não sabe o que fazer com ela (pois nunca viu uma mulher na vida). Perdoo o Siegfried, pois quando era mais novo, provavelmente não saberia o que fazer se uma Valkíria caísse nos meus braços (provavelmente a chamaria para jogar Super Mario ou Bomberman). Após o beijo, Brünnhilde acorda e pergunta quem é o heroi, que prontamente se identifica. Brünnhild conta que salvou a vida dele antes, e Siegfried cogita ser Brünnhild sua mãe, o que é logo desmentido. Brünnhild ainda faz-se de difícil por um tempinho, mas logo rende-se ao amor do guerreiro volsunga cheio de testosterona. Fim da ópera.
Para concluir, embora Siegfried seja musicalmente e liricamente mais fraco que Die Walkürie, possui uma parte inportante da história. Apesar disso, os detalhes da narrativa deixam a desejar, além dos personagens. Fafner, Brünnhild e Siegfried são muito vazios nessa ópera, e Fafner não é o mesmo de Das Rheingold nem Brünnhild é a mesma de Die Walkürie. O destaque absoluto vai para Wotan, que mostra-se diferente e interessante (até certo ponto cínico), mas em geral, faltou um trabalho psicológico maior nos personagens, diferente do que ocorre nas óperas anteriores. Brincadeiras a parte, o Siegfried de Siegfried é um estereótipo de super-guerreiro-bombado-vazio (supergepumptleerkrieger), que não me agradou, mas ainda tenho ótimas espectatívas para o Götterdammerung. Esse livro é bônus do DL, e foi feito em decorrência do tema de Março. Clique aqui para ver a página de Março.
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