O livro é escrito na forma de cartas de uma mulher para seu irmão no outro lado do globo. A narradora, depois de muitos anos fora, retorna a casa em Manaus se depara com a decadência familiar. "Relatos de um certo Oriente" é um livro onde a memória é o recurso mais importante, e o presente e o passado se confundem. A narrativa é lenta, mas cheia de estórias, como a de Soraya Ângela, menina deficiente que morreu de forma brutal antes da partida dos irmãos, ou a de Emir, irmão suicida de Emilie, ou a de do fotógrafo Dorner, e entre muitas outras.
"Estavas ausente naquela manhã. Emilie te levara ao mercado, os tios dormiam e Samara Délia madrugava na Parisiense com vovô. Tudo aconteceu de uma forma rápida e inesperada, como se o golpe fulminante da fatalidade perseguisse o corpo de Soraya Ângela" (HATOUM, 2004, p.15)
A riqueza de personagens no livro é tamanha, que deve-se ler com muito cuidado, prestando atenção nos muitos detalhes da personalidade de cada um, que compõe o quebra-cabeça da memória da narradora, que descreve tudo como uma perfeita observadora. O fato de haverem muitas personagens e relativamente poucas páginas (166 na edição convencional), a riqueza da descrição da personalidade individual é perceptível em todos os personagens.
Outro ponto importante de se perceber na obra é a sociedade híbrida presente nela, que se compõe de escravos (mesmo após a abolição da escravatura), libaneses, índios, amazonenses e demais estrangeiros, e alguns comportamentos sociais que variam do comum ao bestial. Ler "Relatos de um certo Oriente" pode ser ler um romance instigante ao mesmo tempo de ler um tratado sobre o comportamento social e psicológico dos habitantes do Amazonas.
O livro supra citado de Milton Hatoum possui tudo que pode se desejar de um livro, principalmente ao tratar-se da coerência e dos conflitos familiares. Um dos melhores livros escritos no Brasil nos últimos anos, que está destinado a pertencer ao cânone da literatura universal.
Nota do Elaphar: 9,6
Edição Lida:
HATOUM, Milton. Relatos de um certo Oriente. 2ª Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, 166p.
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